Parou no sinal vermelho e seu olhar imediatamente encontrou outro olhar, o da mulher com as sacolas de plástico no ponto de ônibus. Imediatamente, lágrimas reprimidas romperam a censura de seus olhos, e um choro repleto de significado veio à tona. Debruçou-se no volante e, naqueles segundos entre o “pare” e o “siga”, conseguiu acessar algo que pensou ter enterrado, mas que o olhar da outra jovem trouxe de volta. Por mais que cada uma tivesse uma vida, vários caminhos e histórias, havia um fio invisível entre elas. E, de alguma forma, ela entendeu que aquela mulher sabia o que ela sentia. Era conhecedora de seu mistério.
Horas antes, tinha experimentado uma profunda solidão. Mas não é isso que somos? Seres sozinhos, que vez ou outra se distraem com afazeres, pessoas, encontros, alegrias? Mas, passado o tempo das distrações, voltamos a ser somente nós e nossa inegável solidão. Algumas vezes a solidão é positiva e plena. Outras vezes, porém, a solidão devora. E, momentos antes daquele encontro de olhares no sinal, uma ausência havia sido capaz de devorar sua coragem. A coragem que ela lutara tanto para alcançar.
O que ela havia entendido, e que provocara o pranto, é que por mais que você seja vitoriosa e segura; por mais que tenha se esforçado, lutado muito por si mesma, alcançado seus objetivos, superado seus traumas… por mais que tudo isso ocorra, de vez em quando a vida vai te testar. Para ver se você realmente venceu, se sua coragem e autoconfiança são genuínas. Ou se um abandono inédito, uma dor nova ou uma rejeição diferente pode reabrir antigas feridas, te conduzir à abismos – velhos conhecidos para onde você jurou jamais retornar – e fazer você duvidar de seu valor.
As histórias mal resolvidas, os silêncios cruéis, as respostas monossilábicas, as dúvidas provocadas pela falta de diálogo e, naquele momento, a recusa de um abraço – que poderia dissolver todo mal entendido e todo abismo que havia entre eles – havia sido a resposta que ela buscava. Não podia mais permanecer ali. Não podia mais insistir em amar alguém que não sabia amá-la de volta e, por isso, partiu. Sem mais adiar, fez as malas, colocou no carro, abasteceu… e, no primeiro sinal fechado, desabou.
Há um provérbio africano que diz: “Borboleta que voa entre espinhos rasga as asas”. Às vezes você é uma borboleta: linda, leve, livre, cheia de vida e cor. Porém, pode ter suas asas rasgadas se voar entre espinhos; ou ter seu amor próprio devastado se amar alguém que não aprendeu a te amar de volta.
Ela consertaria as próprias asas. Já tinha se despedaçado um milhão de vezes, e infinitas vezes havia ficado de pé novamente. Era sensível e intensa, mas amar demais alguém a assustava. Desejava uma vida em que pudesse se atirar sem medo de se estilhaçar; uma existência mais profunda onde houvesse sede, vontade, empenho. E onde não fizessem parte os silêncios, o medo, e a frieza gélida que a afastava.
Porém, uma nova consciência a alcançara: por mais que desejasse o pacto, a união, o relacionamento com alguém… nada a livraria de si mesma, e do retorno para o único encontro realmente possível: a inevitável solidão que a habitava (e que habita qualquer um, invariavelmente).