É difícil aceitar que a gente não tem o controle sobre tudo. É difícil perceber que nem todos irão permanecer ao nosso lado, mesmo que a gente deseje muito. É difícil escolher um caminho tendo que renunciar a outro. É difícil desistir de uma história que acabou no dia a dia, mas não finalizou dentro da gente. É difícil perdoar nossa incapacidade de abraçar o mundo e aceitar as despedidas que acontecem com ou sem o nosso consentimento.
Dizem que a vida segue e o tempo cura, mas muitas vezes não queremos que o tempo cure nada, pois “nos curar” das lembranças e do que sentíamos significa aceitar o fim, e isso é tão difícil de lidar que acabamos nos prendendo à dor, pois ela – ao contrário do esquecimento – ainda pode nos ligar àquela história, mesmo que de forma distorcida.
Ela era péssima com despedidas. Comprava as passagens, fazia a mala, enxugava o pranto e não olhava para trás. Mas dentro de si as horas não passavam, o calendário não avançava, as estações congelavam. Sorria um riso machucado e acenava um adeus ensaiado.
Ela não entendia o porquê de ser assim. Mas sabia que algumas coisas dentro de si eram impossíveis de serem dominadas. Podia sorrir e acenar gentilmente, mas não era capaz de controlar o lamento silencioso que a habitava, e que lhe contava que a dor enfeitiçava, e por isso tinha que sorrir, só por teimosia, para não dar o braço a torcer para a melancolia.
Desistir, despedir e desapegar eram verbos que ela não tinha aprendido a conjugar, pois havia sido instruída na escola da esperança, e seus cadernos tinham as folhas preenchidas com a caligrafia da saudade. Arrancar uma a uma aquelas páginas doeria, mas precisava ressignificar os verbos sentir e perdoar, pois não havia nada de errado em seguir em frente, do mesmo modo que não devia haver culpa em deixar pra trás.
Pois no final das contas, a gente cai, levanta, se esfola e cresce. Mas acima de tudo, sai mais vivo.
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A gente pode até “ser péssima com despedidas” mas está se despedindo, desde que nasce, começando por dar tchau para o útero quentinho de onde a gente não queria sair mas teve que. Se despede do berço e do colo de mãe, quando aprende a andar; se despede dos sons guturais que só “ela” entendia para falar mamãe, com o capricho de pronunciar todas as sílabas; se despede do seio “dela”, de onde vertia nutrição e aconchego para a frieza das tigelas com papinhas mornas nelas, em nada semelhante ao intercâmbio celestial daquele abraço, antes; se despede “dela” para entrar na escola no primeiro dia, onde tudo é novo, o uniforme, os cadernos coloridos e os lápis de cor, os coleguinhas, a professora e a carteira onde apoiar os rabiscos de quase desenhos; a gente se despede da infância, da juventude, da madureza e, na velhice, se despede da agilidade, dos cabelos e dos dentes, após ter dado adeus aos amigos, aos pais e às vezes ao filhos e netos, até se despedir dessa vida que alguns acreditam única mas que é só véspera de outra, assim como quem entra em Nova Escola, com um pouco de medo, é verdade, mas para saber cada vez mais.
Transformou em palavras meus sentimentos que não queria esclarecer.