Todos perdemos pessoas. Amigos, parentes, amores, companhias, animais de estimação. Heróis. Gente querida, parceiros na luta, seres amados que vêm e vão o tempo todo. Não tem jeito. É da vida.
Eu já perdi tantos deles! Muitos. Mas acontece que nenhum foi embora. Todos eles continuam aqui, firmes, fortes, atentos, respirando nas minhas lembranças. Fazendo das suas. Porque tem coisa que nem a morte é capaz de levar embora. Não é, não.
Com todo o respeito ao inevitável fim da existência material e provisória de cada um, não há morte que cale os sonhos doces, as canções de amor, as largas esperanças, o trabalho honesto e a beleza dos gênios. Porque tudo isso é o sopro amoroso de Deus sobre nós. É o Criador nos abraçando em escancarada grandeza nos recados divinos trazidos até nós, por meio dos homens e mulheres que vez em quando caem do céu. Isso vive para sempre.
A morte leva embora muita gente, muita coisa, mas também deixa tantas outras! Há mais eternidade entre nós do que somos capazes de reconhecer.
Não, o mundo não fica mais pobre quando morrem os nossos heróis. Ele empobrece quando esquecemos, atropelamos, ignoramos a beleza e a labuta de cada um deles. Na vida ou na morte. Ficamos mais pobres quando fechamos os olhos, os braços, o coração e esquecemos o quanto podemos ser grandes e simples. Quando insistimos em virar a cara para os gestos bonitos da vida, os carinhos divinos, os pequenos milagres e as tantas manifestações sublimes da criação ao nosso alcance. Todos os dias.
Alguns de nós vivem lá e cá. É certo. Têm os pés no chão e o resto nas estrelas. São os que nos elevam, nos abstraem, nos envolvem com sua mágica e nos entregam um sincero recado de Deus: “vivam que a vida vale a pena!”. Fazem isso com tanta beleza, flutuando tão leves entre nós, que a gente tem vontade de dar um jeito no mundo e a luta até parece mais fácil.
Uma hora retornam para o alto. Rumam de volta ao céu, decolam para a vida em Marte. Absolutos iniciantes, recomeçando a aventura do sonho em outros cantos. Deixando-nos cá embaixo no caminho, vivos, perplexos, seguindo para só Deus sabe onde.
Sentidos, sentindo lá dentro que não tem morte que vença: certas coisas vivem para sempre.
A morte não está com essa bola toda, não, porque ela não existe. Nenhum pintor destrói suas obras de arte, após terminá-la. Somos obras de arte para Deus, impossível sepultá-las sob a terra ou incinerá-las, ainda que imperfeições nos identifiquem, porque não soubemos preservá-las. A gente perde chave, celular, perde tempo, perde o ônibus, perde a hora mas a gente não perde pessoas mais ou menos queridas, não, porque elas apenas mudam de uma dimensão para outra, por enquanto, invisível aos nossos olhos, assim como o vento que não conseguimos ver, mas impossível negar sua existência. Na verdade a morte não leva o mais importante da vida, mas também não leva o menos importante também, porque nosso critério de avaliação nem sempre julga com justiça, ao listar itens que valem ou não a pena. No entanto, óbvio, há que se preparar para essa viagem, porque tudo o que conseguimos pegar, não levaremos: celular, carro, Tv, dólares, jóias, e até mesmo nosso corpo perecível, vestimenta trocada por outra, nosso espírito imortal. Mas poderemos levar muita coisa, muita mesmo. Sentimentos (bons ou maus), pensamentos (idem), inclinações, preferências, vocações, dons, pendores, ideais, lembranças e saudade. E para onde vamos, é fácil deduzir: “Liberta uma serpente e ela procurará uma toca. Solta uma andorinha e ela buscará a altura”.
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