Quase todos os narcisistas são inseguros e pouco saudáveis

Por Caroline Beaton

Os narcisistas muitas vezes admitem seu narcisismo, mas nunca seus efeitos colaterais. Se você considerá-los por suas próprias palavras, como pesquisadores fizeram durante décadas, por meio de questionários de autoavaliação, seria muito possível pensar que eles são mais felizes, saudáveis, espertos e criativos, e menos ansiosos do que todas as outras pessoas. Porém, só recentemente os pesquisadores começaram a estudar os narcisistas em um nível fisiológico, e esses achados mostram um retrato bem diferente.

Em um desses estudos, a psicóloga americana da Universidade de Michigan Robin Edelstein e seus colaboradores deram a alunos de graduação dez minutos para preparar um discurso. Aos estudantes foi dito que a plateia seria composta de especialistas em comportamento humano – os quais eram, na verdade, apenas observadores orientados a não assentir com a cabeça, sorrir ou reagir quando os estudantes estivessem se apresentando. Então os pesquisadores retiraram as anotações dos alunos antes de cada discurso, e eles tiveram que apresentá-los de memória ou de improviso para uma plateia nada responsiva.

Um experimento simples como esse gera uma causa de estresse fidedigna, e que causa um aumento repentino no cortisol, o hormônio do estresse, que pode ser medido pelos pesquisadores. Você poderia pensar que a confiança dos narcisistas poderia atenuar o estresse. Mas, na verdade, o narcisismo foi associado com o aumento do estresse. Embora houvesse uma diferença mínima em níveis de cortisol entre as mulheres, em homens, um maior narcisismo foi prognóstico de uma grande reatividade de cortisol e humor piorado. Outra pesquisa, com experimentos diferentes, apresentou resultados semelhantes: os narcisistas ficam mais estressados fisicamente do que os não narcisistas quando precisam se apresentar em público.

“O narcisismo implica em custos psicológicos”, afirma Joey Cheng, psicóloga da Universidade de Illinois, nos EUA. Em um de seus estudos, ela mediu o cortisol e a alfa-amilase, dois biomarcadores de estresse produzidos pelo sistema nervoso simpático (nossa resposta do tipo “lutar ou fugir”). Durante um período de três dias, ela descobriu que os narcisistas produziam grandes quantidades de ambos os marcadores quando passavam por emoções negativas em resposta a frustrações do dia a dia.

“O sistema de resposta ao estresse dos narcisistas é particularmente sensível às emoções negativas do dia a dia”, diz Cheng. “Entre os indivíduos não narcisistas, não se vê esse resultado elevado dos marcadores de estresse.” E, o que é muito interessante, os narcisistas têm níveis elevados de cortisol e alfa-amilase, os quais não estão fortemente correlacionados. Considerando que o cortisol reflete o estresse imediato e preciso, a alfa-amilase está mais associada com o estresse crônico, no longo tempo. A pesquisa de Cheng indica que os narcisistas podem sofrer mais dos dois.

Mas por quê? Por que os narcisistas são tão estressados? Alguém poderia pensar que os narcisistas são mais estressados que os não narcisistas porque são, na verdade, mais inseguros. Cheng afirma que sua pesquisa é consistente com a teoria antiga de que os narcisistas são, mesmo que pareça um contrassenso, menos confiantes e menos capazes de lidar com reveses.

O que Cheng e outros chamam de “ego frágil” do narcisista pode explicar por que eles ficam mais agitados com aborrecimentos diários. “Se fossem realmente confiantes, e não frágeis e vulneráveis, eles apresentariam um padrão contrário, em que haveria menos estresse no corpo em momentos críticos”, diz Cheng. Em vez disso, os narcisistas armam uma fachada de autossatisfacao que cai toda vez que algo dá errado.

O ego frágil explica por que os narcisistas têm oscilações de autoestima frequentes e substanciais. Se você tirar uma nota ruim em uma prova, ou receber uma avaliação de desempenho ruim em um trabalho, sua autoestima provavelmente é abalada. “Contudo, para o narcisista, é muito mais do que isso”, afirma Edelstein, a psicóloga de Michigan. Se algo bom acontece, os narcisistas veem isso como confirmação de seu brilhantismo. Se algo ruim acontece, eles ficam arrasados.

É verdade que as pessoas passam por níveis altos de narcisismo depois de acontecimentos positivos e níveis menores em épocas de estresse. Além disso, para os narcisistas, quando existem muitas provas de que eles não são tudo aquilo que pensaram ser, é estressante. Discrepâncias percebidas entre o self ideal e o verdadeiro de uma pessoa estão associadas com problemas de adequação, baixa autoestima e um maior efeito negativo.

Os narcisistas também podem passar por mais estresse do que os não narcisistas em razão de sua sensibilidade singular ao estresse social. Edelstein e outras pesquisas sugerem que os narcisistas têm maior cortisol e reatividade cardiovascular em situações socialmente ameaçadoras, por exemplo, quando uma pessoa está sendo observada ou julgada.

Por quê? O narcisismo costuma ser definido e medido como a utilização dos outros para “saciar a necessidade de admiração e reconhecimento” e “autossuficiência”. Logo, por definição, os narcisistas buscam os outros para aumentar sua autoestima frágil – o que significa que cada interação social implica em altos riscos. Em seu estudo com os discursos, Edelstein acredita que a “experiência de não receber uma resposta do público foi particularmente estressante para eles [os narcisistas]”. As pessoas não narcisistas, em contraste, são menos dependentes dos outros para sua própria valorização, por isso ficam menos socialmente estressadas.

Além disso, a personalidade dos narcisistas torna a conexão social genuína muito difícil, o que pode exacerbar o estresse. Por exemplo, os narcisistas têm menos matéria cinzenta nas regiões cerebrais associadas com a empatia emocional. Elas também são defensivas e menos confiáveis. Assim, o enigma do narcisista, como um pesquisador observou, é que “seu comportamento social em geral acabam com as relações com as quais eles querem contar para manter sua autoimagem de grandiosidade”. Como as pessoas sem um bom suporte social são particularmente suscetíveis ao estresse, os narcisistas sofrem muito não somente com o estresse social, mas na vida de um modo geral.

Contudo, a correlação entre narcisismo e cortisol persiste mesmo quando há controle para um suporte social percebido. Por que outros motivos os narcisistas ficariam estressados? A melhor explicação em potencial – mais do que uma teoria pessoal – é que, ao ficar estressado, o narcisista se sente importante, o que reforça tanto o estresse quanto sua grandiosidade. Se os narcisistas segurassem essa autoimportância inflada, tudo o que daria errado seria aumentado na mesma escala. Seu estresse serve para mascarar sua verdadeira insignificância. Mesmo tragédias grandes podem ser excessivamente trágicas: por exemplo, sobreviventes de acontecimentos traumáticos são mais propensos a desenvolver transtorno de estresse pós-traumático se forem narcisistas.

O estresse constante predispõe os narcisistas a problemas de saúde como câncer, pressão sanguínea alta, doença arterial coronariana, diabetes e derrames, afirma Cheng. Por exemplo: um estudo descobriu que mulheres egocêntricas mostraram hiperatividade de certos indicadores cardiovasculares vinculados a doenças do coração. E um estudo longitudinal de autoria de Edelstein sugere que narcisistas hipersensíveis desenvolvem mais sintomas depressivos, problemas de saúde e uma menor satisfação com a vida na meia-idade. O estresse do narcisista – associado às suas características de impulsividade, busca pela atenção e complexos de invencibilidade – também pode instigar um meio de lidar com as adversidades nada saudável, na forma de abuso de substâncias, direção perigosa, transtornos alimentares ou sexo desprotegido.

Nas últimas três décadas, o narcisismo americano aumentou em 30%. Ao longo do tempo, o narcisismo piorou nos indivíduos com melhores condições de vida e pouca reatividade emocional. Conforme o padrão de vida em nosso país aumenta e as pessoas estão expostas a um nível menor de sofrimento, é possível que nosso narcisismo aumente com, consequentemente, nosso estresse e seus efeitos colaterais. Talvez esse seja o equilíbrio da natureza: se ficarmos muito pretensiosos, começaremos a sofrer até voltarmos a um nível de maior humildade.

TEXTO ORIGINAL DE VICE



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Blog oficial da escritora Fabíola Simões que, em 2015, publicou seu primeiro livro: "A Soma de todos Afetos".

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