Não é que meu coração seja frio, só não me entrego para qualquer um. Isso não é frieza, é sinceridade. E esse meu jeito, meio desapegado, a principio, pode parecer um pouco desinteressado. Não é. Algumas pessoas tomarão isso como verdade absoluta e desistirão de mim na primeira oportunidade, não as culpo. É que nessa cultura do descartável a entrega imediatista também ocupa seu lugar, na mesma proporção. Entregam-se o corpo para prazeres momentâneos e reservam a alma distante de qualquer aparente apego.
Não estou aqui para ditar regras universais e irrefutáveis. Cada qual possui a sua verdade mutável – porque o que hoje é dito como verdadeiro, amanhã pode ganhar nova roupagem e tornar-se outra – e, assim, eles acreditam no que calha de ser melhor, eu entendo meu coração melhor do que aquém do olhar distante da maioria: ele não é frio, porém nega-se sua entrega para superficialidades. Meu coração acelera para profundidades. É preciso um gostinho para se aventurar em profundezas pouco exploradas até por mim mesmo.
Fico na minha e vou aproveitando o momento, sem criar muitas expectativas e sem causar ilusão – se é que uma pessoa simples como eu pode as causar – desnecessária. Não sou aquele tipo de pessoa perfeita, nem o quero ser, tenho meus defeitos e erros como qualquer ser humano que se preze, mas reconheço que sou alguém interessante dentro das minhas limitações estéticas que, olha só… dá até para andar de mãos dadas por aí… falando sério, além do externo meio disperso na maioria das vezes, sou um universo de coisas boas para ser explorado para quem tem coragem de me mergulhar acolá de um boteco com cerveja gelada, alegrias diárias e um mesclar de sexo-sem-nenhum-pudor e carinhos esquecidos décadas atrás. Não é para qualquer um, obviamente.
Que não me entrego fácil é bem evidente, e isso não tem como maquiar; sou feito de sinceridades. Porém basta uma mão certeira no meu coração que me derreto todo. Saber segurar um coração com cuidado é uma especialidade que carece de treino rotineiro. A maioria desiste no primeiro obstáculo. É preciso ponderar entre a suavidade do toque e a firmeza do abraço. Tem que fazer sentir, sem bater. Saber proteger e deixa-lo livre para seguir sozinho, ao mesmo tempo. Sei que não é aprendizado que se obtém de uma noite para outra, com algumas horinhas de estudo antes da prova. Não funciona assim. Funciona na base da paciência e uma insistência leve, tranquila, constante.
Quando me entrego não têm rodeios e nem dúvidas. E essa é a parte que vale a pena. Há apenas uma maneira de ser verdadeiro nos meus relacionamentos, me possuindo por completo. Sem devaneios, sem mais ou menos. E isso vale para as amizades como para quem digo que “eu gosto de você” como prelúdio do amor romântico que nasce em mim. Meu coração até pode aparentar ser meio frio, às vezes, mas com o cuidado preciso e sem joguinhos de quem se entrega menos, ele aquece, derrete, e se molda para ser a melhor versão de si mesmo. Um coração que demora em se entregar, quando se entrega, não volta atrás, segue firme para frente lado a lado de quem resolveu ficar.
Imagem de capa: Kate Kultsevych, Shutterstock