Nunca entendi muito bem essa premissa de “amor que completa”. Eu sou completo. Independente. Bem resolvido. Saio por aí sozinho e adoro. Tenho meus amigos, minha família, meus hobbies. A vida é tranquila, de vez em quando algumas dificuldades, mas, faz parte. Ficar sozinho em casa é uma delicia e, em nada, isso me incomoda. Contudo, pensar em “alguém para me completar” de maneira amorosa é uma ideia que, pensando razoavelmente, seria legal. Então desejava também esse alguém para me completar. Completar em quê? Bem, não sei… O amor vai me dizer quando encontrar esse “alguém para me completar” pensava confiante e, procurava em cada novo relacionamento esse complemento. Esse êxtase do “enfim, encontrei”. Não encontrei um amor para me complementar além do indissociável próprio.
Parei de ir atrás do amor que me complementasse. Deixa estar o que for para ser. E resolvi ser ainda mais completo em si próprio porque, vamos concordar, não quero ser para ninguém uma metade do que eu sou. Ou sou inteiro, ou sou nada. E também não quero relacionar-me com migalhas de sentimentos. Pessoas inteiras são mais saborosas. Dão gosto de conviver e admirar. Sou feliz sozinho e, a cada novo amanhecer, preencho-me com prazer tudo aquilo que me faz bem; trabalho, estudo, família, amigos, hobbies e, enfim, sou um misto de tantas coisas que acredito ser, para qualquer pessoa um universo infinito a ser explorado. Completíssimo.
Tem coisa mais sem graça do que um amor que completa? Que completa aquilo que deveríamos ser sozinhos? Pessoas incompletas abraçam com fraqueza, não aperta o nosso coração; beijos incompletos não arrepiam a alma, só umedecem algumas partes do nosso corpo – que não é ruim, claro; pessoas incompletas não podem amar com sinceridade, porque parte sempre estará faltando; amor só se faz de gente completa em si própria. Gente completa não é perfeita, mas é verdadeira.
Até que um belo dia alguém me despertou um sorriso a mais. Através do sorriso dela, eu sorri. Não completou o meu, o meu sorriso era – e ainda continua sendo – torto, nem tão bonito assim, porém o dela somou ao meu e o deixou incrível. Sorri com os olhos, com a boca, com o coração. Transbordou. Sem esperar encontrar o amor que me completasse, encontrei aquele que me transbordaria diariamente. Por toda a vida.
Passamos a sair juntos para os lugares que eu frequentava sozinho e, novas cores surgiram onde eu não tinha percebido antes – culpa dos olhos dela. As minhas tardes maratonando séries deixaram de serem ótimas para, com ela, precederem com idas ao supermercado para comprar salgadinhos e refrigerante e, o que era ótimo passou a serem maravilhosas e incríveis – discutir, procurar, dormir no meio das séries com ela é tão bom. Cozinhar para um é bom, mas a gente fazendo experiências na cozinha e acertando, errando, sorrindo, se lambuzando é muito melhor – uma vez nos lambuzamos com Nutella. As baladas se tornaram ainda mais divertidas a vendo sorrir e dançar, com sua skol beats secret em uma das mãos e a outra dadas com a minha – da pipoca para a cachaça é um ciclo que a gente pretende fazer por muitos anos. Nunca me imaginei comendo sushi, mas, com ela, são os melhores jantares – essa é a única coisa que não prometo cozinhar para ela, deve ser bem difícil.
Relacionamento é para transbordar a gente. Um amor que completa é meia boca. Não dura, não enaltece. Tudo que a gente faz sozinho e se diverte assim, com a pessoa certa ganha nova dimensão, coloca a gente para fora da mesmice de amores rasos. Vagos. Sem gosto além do gozo momentâneo, sexual, banal. O amor que transborda só é possível com a plenitude de dois completos, um amor que transborda não acaba, cresce, cresce, cresce e, cresce.
Imagem de capa: Jurij Krupiak, Shutterstock