Estava vendo um filme alemão na TV, rodado na Baviera, onde se fala um dialeto regional. Lá, quando alguém se despede, não diz “Auf Wiedersehen!” ou “Tchüss!“, como no resto da Alemanha. Lá se diz “Servus!” (que é ótimo para estrangeiros, pois é fácil de pronunciar), mas se diz também “Habe die Ehre!”, que significa “Eu tenho a honra”. Tanto “Servus!” como “Habe die Ehre!” podem ser ditos ao chegar como ao se despedir.
No filme, dois homens se encontraram e se cumprimentaram com “Habe die Ehre!”. Eles conversaram por um longo tempo e, ao se despedirem, disseram novamente “Habe die Ehre!”.
Fiquei pensando sobre isso. É uma forma bonita de se saudar e se despedir. “Eu tenho a honra de encontrar você!”, “Eu tive a honra de encontrar você!”. É uma maneira de dizer ao outro que ele é estimado e respeitado (mesmo que as pessoas nem sempre pensem no significado dessas palavras ao dizê-las). São palavras gentis.
Identifiquei-me com “Habe die Ehre!” porque é assim que costumo encontrar as pessoas.
Ser gentil não é questão de ser politicamente correto nem de mera formalidade social. É muito mais uma questão de ser humano, um ser social, que precisa das pessoas à sua volta e que por isso precisa honrá-las para assim honrar a si mesmo, já que cuidar bem de suas relações é cuidar bem da própria necessidade humana de ter a companhia de outros humanos e não viver isolado.
Seria tão bom se não desaprendêssemos a nos respeitar mutuamente, mesmo em momentos críticos, em fases duras da vida, mesmo quando a discussão é cerrada, a tensão à nossa volta aumenta e os histéricos já ensaiam entrar em pânico.
Precisamos ter cuidado para não perdermos um dia esse dom tão lindo que temos de viver em grupos sociais, de sermos capazes de nos relacionarmos pacificamente com nossa própria espécie e de superarmos os obstáculos da vida juntos, unindo nossas forças e nossas ideias.
O problema é que muita gente anda rude, a hostilidade, a grosseria e a falta de respeito e boas maneiras só parecem aumentar. Os rudes, porém, não são a maioria, disso estou convicto. Os rudes só são mais barulhentos e chamam mais a atenção. Mas, mesmo como minoria, eles são perigosos porque polarizam e atrapalham assim nossas relações.
Gente insegura, assustada com o barulho dos rudes, termina se deixando instrumentalizar, o que faz com que a grosseria cresça ainda mais e o resultado é essa grande falta de empatia e respeito que vemos por aí atualmente.
Não precisamos disso. E isso não nos faz bem! O que precisamos é despertar, sim, acordar e perceber o óbvio: se os rudes são uma minoria barulhenta, eles só incomodam porque uma maioria gentil anda calada. Sim, é isso mesmo: andamos nos calando perante a grosseria, dando espaço para que os rudes se espalhem e façam ainda mais barulho.
Peço aos gentis que não se calem, pois precisamos de palavras gentis. Precisamos de gente que honre o outro, mesmo quando o outro é difícil, mesmo quando a situação é complicada, mesmo quando muitas coisas incentivam a pagar grosseria com a mesma moeda. Precisamos de gente que entende que perder o respeito pelo outro, por sua dignidade, reagindo então com a mesma grosseria, não é somente desonrar o outro, mas também a si mesmo.
Não tenha medo de ser gentil, não tenha medo de honrar o outro ao encontrá-lo, mesmo que ele seja grosso, mesmo que você não goste dele, mesmo que queira manter uma distância saudável daquela pessoa. Não somos obrigados a gostar de ninguém, podemos discordar de opiniões e não temos que conversar com todo mundo, mas, quando o fazemos, quando entramos em contato com o outro, seja de que forma, o respeito é intocável, inviolável e deveria valer sempre e para todos.
Se um rude cruzar seu caminho, lhe tratar mal e faltar com respeito por sua pessoa, não aceite, diga isso a ele, mas diga com gentileza. O resto depende então do outro: se ele estiver aberto ao diálogo e disposto a se comunicar de forma respeitosa, tudo bem, prossiga gentil. Mas, se ele reagir com grosseria, rejeitando o diálogo civilizado, despeça-se cordialmente e se afaste, pois a gentileza é um presente que não devemos desperdiçar com gente que insiste em ser grossa e não está interessada em um outro nível de comunicação. Se afaste, mas sem ser grosso, pois, assim, você não estaria sendo diferente de quem lhe tratou com grosseria.
Nunca esqueça: gentileza gera gentileza!
O importante é cuidar da própria gentileza, respeitando o outro e também a si mesmo, sem se deixar contaminar pela grosseria dos rudes, já que a gentileza é a base que segura nossos relacionamentos em um nível saudável e respeitoso. Seja gentil e a gentileza à sua volta aumentará. Seja grosso ou se cale diante da grosseria e os rudes vencerão!
Vamos ser então gentis, pois é nossa gentileza que cicatriza muitas feridas causadas pela grosseria que vemos por aí.
“Habe die Ehre!“, prezado leitor ou prezada leitora. Foi uma honra encontrar você.
Imagem de capa: William Perugini, Shutterstock