Dava para ler em cada entrelinha da rotina que levávamos, entre um beijo e outro, entre um amasso e outro, entre um brinde e outro. Pulsava uma felicidade infinita na minha íris, refletida na tua. Nosso riso dançava nos olhos e lembro como se fosse ontem o dia que você sussurrou entre meus cabelos: adoro gente que sabe sorrir com os olhos. Quis retribuir a fala, porque teu riso era pintado em cada faceta dos teus olhos claros. Cada vez que você derramava palavras entre meus cabelos, meus olhos ardiam de feliz. E o riso intensificava nos lábios. E a fala secava na garganta. E você sabia muito bem disso, pois sussurrava o mundo inteiro, só para ver sorrir.
Tínhamos tudo para dar certo, sabia? Éramos quase um espelho e a prova concreta de que o ditado “os opostos se atraem” era pura balela. Éramos iguaizinhos. E aquilo que tínhamos de diferente, logo passou a ser similar. Eu sorvia teus gostos e você aprendia com os meus. Aprendi a gostar de tantos filmes tão teus, de tantas músicas desconhecidas, de tantos sabores indistintos. Eu me vi em tantos bares e shows e caminhos improváveis, lugares que meus pés jamais me levariam, mas que a tua companhia me acompanhou muito bem. Cada canto diferente que vivenciei ainda é guardado com carinho na minha memória teimosa.
Tínhamos tudo para dar certo, sabia? Dançávamos a mesma música, de um jeito completamente louco, desafinado e destrambelhado, mas nada importava face ao riso que nos acompanhava. Vê? Tinha sempre (muito) riso. Tinha sempre (muito) sorriso. E a gente tinha tudo para dar certo. De um jeito louco e ansioso, demos certo logo de início. Aquele lance de paixão à primeira vista. Ou ao primeiro gole de cerveja. Eu amei você naquele abraço mal dado e amei você quando teus olhinhos riram para mim pela primeira vez. E amei você naquela chuva de pipoca, num jogo de futebol que não vimos. E fui te amando cada vez mais, cada dia mais. E te absorvendo todo. Você tinha tanto para me ensinar e eu tinha sede de aprender. Nos completamos assim e tinha tudo para dar certo.
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Só que não soube lidar com a falta de rótulos. Besteira minha talvez, mas eu deixei o coração gritar mais alto e o grito ensurdeceu a nossa rotina bonita. Deixei de ver as nuances azuis que havia e passei a querer mais. A gente tinha tudo para dar certo, para ir além, para ir mais um pouco. Mas você foi freando essas minhas expectativas bobas e sonhadoras e, tudo bem. Talvez eu fosse só uma garotinha mimada querendo mais atenção que nunca. Ou talvez você fosse esse galanteador barato, que faz massinha de modelar com qualquer sentimento alheio…
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