A vida precisa de faxina. De reciclagem. De ressignificação.
De tempos em tempos, precisa que a gente mude os móveis de lugar, troque o tapete, pinte a parede de uma cor diferente. Depois de algum tempo, precisa que a gente rasgue alguns papéis, libere espaço nas gavetas, ventile o ambiente, se desapegue daquilo que deixou de ter significado.
Eu costumava me sentir culpada de jogar a maioria dos cadernos antigos do meu filho fora. Porém, no ano seguinte, outra pilha de cadernos se somava à anterior, e eu acabava descartando aqueles que havia guardado. Hoje, conservo apenas um de cada ano, e pode ser que lá na frente eu descubra que não faz mais sentido guarda-los também. Porém, no momento ainda é importante para mim. No momento ainda faz sentido manter aqueles cadernos encapados com adesivos do Minecraft que mostram a evolução da letrinha cursiva e me lembram a fugacidade da infância.
Leva tempo até que a gente se sinta pronto para se desapegar de histórias, objetos, hábitos e pessoas que se quebraram. Como um vaso quebrado, insistimos em colar os cacos, imaginando que podemos manter a peça intacta, como era anteriormente. Nos apegamos aos fragmentos e esquecemos que coisas boas acontecem para quem libera espaços, para quem redimensiona o passado e dá uma chance ao futuro.
Não se trata de vingança. Mas às vezes você tem que parar de direcionar o seu afeto e a sua atenção para quem não é recíproco com você. Deixar de mandar mensagens para quem só aparece quando tem interesse, parar de insistir num encontro para um café com quem sempre arruma uma desculpa, manter distância de quem tenta te diminuir, deixar de ter expectativas após longos silêncios e prolongadas ausências, aprender a se proteger e se valorizar, entendendo que nem sempre gostar muito de alguém é pré-requisito para essa pessoa também gostar muito de você.
Nem sempre ter afeição por alguém é o suficiente para essa relação funcionar. De vez em quando você tem que ter feeling, sensibilidade e diplomacia para se resguardar e se afastar. Fomos educados a agir com tolerância e perdão, mas isso não significa autorizar que algumas pessoas nos subtraiam, ou que nossas vidas fiquem suspensas à espera de um gesto de reciprocidade que nunca ocorrerá. De vez em quando você tem que acordar e perceber que esteve remando o barco sozinho, e que já é hora de parar.
A vida precisa de faxina. E isso inclui fechar algumas portas e dar fim a algumas histórias. Nem tudo cabe em nossa nova etapa de vida, e temos que ser corajosos para abrir mão daquilo que um dia teve significado e hoje não tem mais. Nem sempre é fácil encerrar um capítulo. Porém, às vezes o capítulo já se encerrou faz tempo, só a gente não percebeu.
Por fim, não se esqueça do ditado que diz: “Não guarde lugar para quem não tem intenção de sentar ao seu lado”. Algumas pessoas não valem nosso esforço. Não valem nosso empenho nem intenção de proximidade. Elas simplesmente não fazem questão. E insistir em manter um laço sem reciprocidade só irá nos desgastar, cansar, decepcionar. Quanto antes você entender isso, mais cedo aprenderá a valorizar quem está ao seu lado, seus afetos verdadeiros, sua história bem contada. E enfim adquirirá uma espécie de amor próprio que não lhe permitirá mais remendar porcelanas quebradas. Entenderá de finais e recomeços, e aprenderá a não sentir um pingo de culpa por se amar em primeiro lugar.
Imagem de capa: Aleshyn_Andrei / Shutterstock
Para comprar meu novo livro “Felicidade Distraída”, clique aqui.
Custei anos para fazer essa faxina na vida ! Restaram pouquíssimas pessoas.
Não foi um processo rápido
Agora é a fase de faxina na família, cansei de tentar reunir a família em datas comemorativas, um ia viajar , outro passaria na casa do namorado …foram tantas e tantas tentativas ….ai vi que não era recíproco, está me doendo muito mas estou d3sapegando inclusive de filhos .,,meu foco é minha saúde mental
Nossa Me identifiquei com você, como é difícil mas para minha saúde mental vou conseguir, Senhor me ajude!!!
Belíssimo e verdadeiro texto sobre a vida, Fabíola Simões. Parabéns!
Realmente temos e teremos sempre que nos policiar e promover a faxina em nossa vida. É um processo demorado, pois sempre existirão obstáculos fincados durante esse procedimento de exclusão. Porém, apesar de demorado, façamos a faxina por sentimentos de “própria culpa”, de favorecimentos insípidos, de tormentas sentimentais; façamos uma varredura ou escaneamento no nosso eu, buscando detectar falhas [in]corrigíveis, e depois otimizar nosso corpo e alma, assim como fazemos em nossos computadores, smartphones, etc. Saibamos filtrar o que realmente é favorável e digno de permanecer conosco, produzindo e aumentando assim nossa saúde mental e corporal.
Amei esse texto, me fez tão bem no momento que estou passando. Que possamos fazer nossas faxinas sem peso na consciência!
Que texto belíssimo. Não é fácil mas é tão necessária essa faxina não é mesmo?? Hoje esse texto é algo que eu precisava MUITO ler. Obrigada, sem saber vc (autora) me disse o que eu tinha q ouvir.
Fabíola, gratidão por esse texto. Exatamente me vejo indo e vindo nas suas palavras. Isso faz parte de um processo individual de evolução e quando entendemos o que aqui está escrito, nos sentimos libertos de muitas amarras e soltamos nosso “Eu”. Parabéns por traduzir tão bem o que nem sempre se traduz com palavras. Beijos Micheline Arouca – Ilhéus – Bahia
Excelente conselho!
Belíssimo texto!
Amei de verdade, tanto que fiquei com vontade de comprar o livro e conhecer mais de suas produções assim como esse texto.
Esse conselho vale também para família? Porque eu tenho um punhado de parentes que não fazem a menor questão de me ter por perto.
Nossa, que texto mais lindo! Apaixonei!!! Kkk
Isto realmente acontece com todos nós, faz parte do processo da vida. É lógico que não é fácil fazer escolhas, tomar decisões assim como descartar objetos e lembranças e deixar pessoas para trás, aquelas pessoas que não fazem questão da nossa presença, e isso demoramos um pouco até perceber, mas acredito que é assim mesmo!