Essa semana um amigo meu me pediu para ajudá-lo a colocar em andamento o seu sonho de escrever. Sentamos e conversamos por mais de uma hora sobre tudo que ele tinha que fazer para alcançar os seus objetivos. Tracei metas para ele, indiquei pessoas que poderiam ajudar, sugeri um cronograma e dei conselhos dos quais eu deveria ouvir, antes mesmo de dá-los. No rosto do meu amigo, vi a mesma sombra dos pontos de interrogação que me fizeram questionar o início do meu processo criativo. A autocrítica, o medo, a procrastinação, todos os sintomas da auto-sabotagem disfarçados de ponderações. Não conseguia entender como a doença da auto-sabotagem podia infectar algumas das pessoas mais fantásticas que eu já conheci. A situação me botou em auto-análise, como sempre.
Dei-me conta de que a procrastinação é o primeiro obstáculo para a construção de algo. Nossos projetos mais amados começam a ser postergados por metas que julgamos “mais práticas” ou “mais urgentes”. A gente espera que o tempo traga aquela coragem tão necessária na hora de arriscar, mas tudo que ele faz – o tempo – é dar tapa na nossa cara. Afinal, coragem não é a ausência do medo, mas a superação dele. E isso exige atitude. A procrastinação é um dos piores defeitos dos criativos. E tudo bem que criação e criatividade têm muito a ver com o respeito pelo timing, inspiração, maturação de ideias, e até a revisão delas. Mas acima de tudo tem a ver com trabalho. Sem trabalho não há evolução. E sem evolução não tem aprendizado. E sem aprendizado, bem, sem aprendizado você vira um inútil vendo o tempo passar e as oportunidades morrerem na praia. (“MAS E O TEU LIVRO, ANTÔNIA???” – pois é!).
PROCRASTINAÇÃO: “Amanhã você vai desejar ter começado hoje.”
A sabotagem ou auto-sabotagem é também algo cultivado pelo ser humano que deveria ser estudado e prevenido em qualquer fase de formação. E quando falo em auto-sabotagem, não falo apenas dela no lado profissional – sabotagem existe, é alimentada e se manifesta em todo tipo de relação. Profissional, pessoal, amorosa. Eu sei disso porque eu sou perita na arte da sabotagem. De tomar o porre da vida na festa do novo emprego que havia começado não fazia três dias. De soltar gafes no primeiro encontro com pessoas importantes. E nem queira me ver comentar sobre auto-sabotagem nas minhas relações amorosas. Tenho certeza que meu cupido me odeia por conta da maneira criativa como eu sempre fodo com o trabalho dele.
Eu tenho uma teoria sobre a auto-sabotagem. Na minha opinião ela surge pela nossa falta de preparo em ver as coisas darem certo. A gente já se acostumou em esperar o pior, e entra em parafuso na eminência do sucesso. Afinal…. vá que dê tudo certo e a gente alcance reconhecimento profissional, relações promissoras e amores avassaladores, né? O que faríamos com o medo de perder tanta coisa importante? Melhor nem ter!
SABOTAGEM: “Aceite/promova as boas coisas que a vida reservou pra você.”
E por último, mas não menos letal na construção de algo, a famosa sina do “eu não sou bom o bastante”. Mas que mania idiota de compararmo-nos com todo mundo, ou de medir os nossos talentos pela régua alheia. Ninguém é tão boa em contar histórias como eu porque ninguém as conta como eu, certo? Ou seja, só eu posso aplicar os meus talentos como eu – ninguém mais – e isso deveria ser o bastante para nos convencer, não é?
O mesmo se aplica ao meu amigo, aquele do início desta reflexão. Não existe um vivente sequer que escreve melhor que ele, porque ninguém pensa como ele. Não há quem cozinhe melhor que a minha mãe, porque a comida dela tem o sabor que é só dela. No mundo inteiro não há quem cante tão bem quanto o meu irmão de 6 aninhos, porque só ele inventa as músicas que ele inventa. E assim vai. Ou seja, talentos não deveriam ser comparados. Apenas compartilhados. E talentos não divididos – já diria uma amiga minha – são a nossa maior prova de egoísmo com o mundo.
SINA DO “NÃO SOU BOM O BASTANTE”: Não seja egoísta com o mundo. Compartilhe seus talentos/sonhos/projetos.
Eu sei que essa mudança não é fácil. Eu tenho uma lista de metas deixadas de lado, e uma gaveta cheia de lindos sonhos engavetados. Mas eu decidi que tudo isso vai mudar. E esta sessão nada mais é que um baita puxão de orelha em mim mesma, e um lembrete que o dia “D” é sempre hoje. E espero que o puxão de orelha chegue aí do outro lado da tela. Vamos lá! Entre nesta luta contra a auto-sabotagem através de três passos:
Comece agora.
1- Aceite as coisas boas da vida.
2- E compartilhe o seu valor com o mundo.
3- O universo vai agradecer, eu prometo.
Fim da sessão.
Imagem de capa: Yulia Grigoryeva/shutterstock
Eu fiquei surpresa com essa exposição da verdade tão íntima e tão singular. É raro texto sobre autosabotage com tanta verdade. Ameiiii
Excelente! Muito apropriado para o momento que estou vivendo!
Escrevi esse texto no começo do mês, depois de ter sido desafiado a colocar meus planos futuros no papel… bom, perdi o desafio porque só me veio isso que está escrito aí embaixo em mente.
Diz respeito ao meu momento e diz respeito a tudo que você escreveu. Nem sei o porquê de colocar ele aqui nos comentários, sério, nem precisa ler, só quis ser diferente uma vez…
Sobre locomotivas e piscinas
O que te aguça? O que te faz ficar assim? Qual o porquê de seus sonhos terem se transformado em dolorosas frustrações? Aliás, quais eram seus sonhos mesmo?
A vida é uma dádiva, mas o tempo é uma piada cruel. Tão logo passamos da nossa juventude, nos encontramos em uma realidade presente estagnada, onde os dias são sempre iguais e ironicamente ao seu lado o mundo corre numa velocidade voraz.
Impressão de que estou parado na estação, o trem chega e parte, pessoas entram e saem dos vagões, porém continuo lá, imóvel, vendo tudo acontecer ao meu redor… apenas registro, apenas observo.
Alguém pede informação e eu forneço, sei onde vão os trens, sei de cor o destino de cada locomotiva e, mesmo assim, não me levanto, apenas registro cada momento, cada detalhe.
Incrédulo de minha própria capacidade, vejo a vida pelo olhar do outro, como se minha própria não tivesse mais graça, uma total desgraça.
Quais eram meus sonhos mesmo? Por onde comecei? Por que parei na estação? Por que não pego o próximo trem?
Em algum momento da minha vida eu sei que parei nessa situação por um único motivo: Eu queria minha própria locomotiva!
Esperava que chegasse meu trem e meu destino estaria selado, queria embarcar logo no meu vagão. Quando cheguei na estação da vida é que entendi o problema: Não existe destino certo para mim, não existe um trem com meu nome.
Então até hoje aguardo para embarcar em algum, mas como não sei em qual, espero para a chegada do mais bonito, do maior e do mais potente que irá me levar para a glória.
Agora percebo que não existe tal máquina locomotora e de tanto esperar já não me lembro mais o porquê de estar sentado.
Hoje vejo e registro o destino dos outros que cada vez mais me pedem menos informações. E cada vez menos eu me importo mais… A vida é uma dádiva que estagna, já o tempo, não.
Nunca é tarde para recomeçar, mas o recomeço precisa de um começo. Bom, por onde mesmo eu comecei? Em qual fase minha vida parou? Qual rumo devo levar? Não tenho respostas no momento. Se pensam que ao final dessa leitura receberão uma valorosa lição, não se frustrem e parem por aqui mesmo.
Não são palavras de conforto, são escritas de improviso. Como minha própria vida, sempre improvisada, cheia de descuidos, nada planejada. Invejo os que tem planos, os que conseguem se focar.
Meus pensamentos são caóticos e muitas vezes vazios. Imagine uma piscina de água cristalina, parada tão perfeitamente que em sua superfície se forma um reflexo perfeito. Agora imagine que alguém pulou nessa água e aquele espelho perfeito se rompeu em enormes ondas. Cada pulo é um pensamento, meus planos estão espelhados no reflexo daquela piscina e no momento minha mente está dando uma festa com centenas de convidados, todos em trajes de banho e mergulhando incessantemente como se fosse a última vez que irão nadar… quanto mais meus pensamentos nadam, mais nada na minha vida acontece.
O grande paradoxo da minha vida: preciso dar fim nessa festa para voltar a enxergar meus planos no reflexo cristalino, mas para isso preciso pensar numa maneira de me organizar. E a cada pensamento, mais um mergulho.
É uma equação que não se fecha de variáveis diversas, mas que ao final somente uma é a que importa: voltamos a pontuar o tempo.
Quanto mais você vive, mais próximo está da morte, porém não é dela que quero escrever. Eu, pelo menos, não estaria escrevendo tudo isso se soubesse que estaria morto nos próximos cinco minutos. Se for para morrer sentado na estação esperando meu trem chegar, então iria preferir dar por encerrado esse texto.
Porém não vou parar por aqui. Eu vim escrever sobre o que vale, eu escrevo sobre a dádiva, sobre a vida. Mesmo estagnada e cheia de pensamentos, ainda vale cada segundo desse irônico tempo que se esgota.
É a vida que nos permite saborear nossos prazeres e é com ela que sentimos, que amamos, que entristecemos. Bom, é dela que devo sempre me focar, nos prazeres, nos momentos de felicidade e nas outras vidas que estão ao meu redor. Mas ninguém é eterno e o tempo cruelmente nos impõe um limite.
Porém também nos apresenta o presente e assinala que temos que aproveitar as coisas que acontecem ao nosso redor. É com ele que construímos nossa base familiar, nossa base de amigos e é com ele que perpetuamos nossa prole, nossos filhos.
Está na hora de me levantar, pegar o trem sem destino, assumir o controle, tirá-lo dos trilhos!
Está na hora!
Novamente me encho de pensamentos… novamente minha piscina transborda meus planos pelo ralo.
Sergio Novita
06/08/2017
Nossa que texto, exatamente assim que me sinto, olhando de uma forma poética. E é engraçado que mesmo querendo entrar em um trem as vezes e mais confortável continuar na posição de observador, voce se torna bom nisso.
🙂
Obrigado pelo texto, me ajudou!
Tenho pensado muito sobre isso. Muita coisa que você disse tem passado pela minha cabeça: as maneiras de me auto sabotar e as maneiras de fugir disso. Não queria que outras pessoas também sofressem disso. Por outro lado, é bom saber que outras pessoas que passam por isso podem compartilhar sua vivência e seu enfrentamento e assim a gente se ajuda, ajuda o outro. A sensação de não estar sozinha nessa luta já é encorajadora. Ótimo texto. Parabéns!