Imagem de capa: Oksana Yurlova, Shutterstock
Ah, que viagem doida é essa, a vida?! Que a gente entra e bem cedo aprende que tem que correr, não perder tempo, não perder focos, que tem que ganhar várias corridas.
Que trem de ferro em linha reta é esse?! Que a gente coloca combustível sem parar nos nosso corpos e mentes e o nosso olhar sempre à frente, concentrado em algum ponto de chegada que o mundo nos ajudou a inventar.
E mesmo quando o corpo chia, o coração suspira e a gente precisa diminuir a intensidade do caminhar, a mente não para de ostentar, o mundo não para de falar. Quando foi mesmo a última vez que a gente parou a própria rotina, os próprios sonhos e expectativas e apenas sentou naquela cidadezinha de beira de estrada e tomou um cafezinho sossegado, sem pensar em nada?
É tudo sempre tão corrido, o calendário sempre preenchido, as horas completas, os dias espremidos. Os nossos pés já nem tocam o chão, passam flutuando por todas as superfícies. Não mergulhamos em nenhuma estação de nós mesmos.
Não dá tempo de entender o sofrimento, de quebrar um círculo vicioso, de romper hábitos que nos fazem mal, não dá tempo de aprofundar, adentrar nos labirintos do coração, desfazer os nós e criar outros ‘eus’.
Não dá tempo de construir outro mundo, pois este já nos escraviza em seus mitos. Nossas mãos práticas seguem as riscas, as receitas, desaprenderam no nascimento a tocar e a conduzir intuitivamente, são agora instrumento de nossas necessidades.
Ah, que vida desenfreada, competitiva, em que a gente voa alto, rápido, em que a gente é avião a jato e gosta de mostrar o ronco forte de nossas turbinas e a grandeza de nossas capacidades de lidar com tudo.
Em que a gente quer ser mais para se sentir mais e ofuscar um vazio escondido, em que a gente quer fazer barulho para não ouvir as vozes do nosso silêncio essencial, em que a gente quer ter mais para não deixar de alimentar a máquina das doces ilusões que nos rodeiam. Em que a gente quer parecer mais para convencer os espectadores desse teatro todo, e a nós mesmo, de que todos os nossos esforços não foram em vão.
Que vida vã é essa, pele espessa que não se deixa cortar, sentir, invadir. Superfícies dura e escorregadia, em que tudo passa e pouca coisa fica. Em que a gente vê passar pela janela vultos de tantas coisas, pessoas e sentimentos, num piscar de olhos, tão rápido que não dá tempo de fazer sentido, de entrar para a memória, de construir belezas em nossos álbuns de fotografia.
A vida é curta, então a gente corre. Que ironia! Vida é travessia, a chegada é a morte. O que fica dessa viagem, se a gente não para e aprecia? Se a gente não desce em muitas estações, e olha em volta, anda e respira? Se a gente não perde a gente mesmo em algumas paragens? Se a gente não recomeça do zero e muda o rumo e decide não ir em frente por um bom período de tempo?
Ah, a vida é curta demais para não parar para admirar as paisagens!