O amor pode se transformar em tudo, até mesmo no que machuca e fere, da mesma forma nos tornando pessoas melhores ou piores, mais felizes ou mais tristes, somando ou subtraindo.
Ninguém pode negar que Coringa e Arlequina, mesmo que por poucos minutos, roubam a cena em “Esquadrão Suicida”. Ainda que sejam personagens bastante populares nas HQs ou que os atores tenham elevado à excelência suas performances, certo é que o romance entre os dois antagonistas carrega um amor com o qual muitos de nós nos identificamos, guardadas as devidas proporções.
Arlequina representa o parceiro que se doa além do razoável, entregando-se incondicionalmente a um sentimento que, na verdade, mais machuca do que cura, mais entristece do que alegra. Obscuro, selvagem, insano, o que ela sente acaba por transbordar os limites morais e éticos que são aceitáveis e desejáveis socialmente, tornando-a alguém teoricamente pior, alguém que transgride as regras e normas convencionais.
E é assim nos apaixonamos por ela, por sua beleza, por suas habilidades e personalidade forte. Arlequina, afinal, representa a libertação de amarras por que muitos de nós ansiamos: ela se torna mais bela, mais desejada, mais perigosa, ágil e proibida. Trata-se, pois, daquilo que nos atrai, mesmo quando sabemos que é errado, simplesmente porque todo mundo já desejou, alguma vez na vida, ultrapassar algum limite, perigosamente.
Coringa, por sua vez, em si carrega todas as características de um anti-herói, de um fora-da-lei, de alguém que fascina, lidera, que é temido e, por isso mesmo, atrai vários olhares femininos. De início, ele percebe, na Arlequina, um meio de atingir os seus objetivos, um mero joguete, porém, acaba por ser vítima do próprio ardil, ao se apaixonar por quem menos esperava. Ah, o amor e suas armadilhas…
Na verdade, o casal de antagonistas simboliza nada menos do que os desejos inconfessáveis de muitas pessoas, quando idealizamos e imaginamos um outro nós, desarticulados das regras e convenções que muitas vezes nos sufocam e questionamos. A grande maioria das pessoas jamais excederá nestes terrenos obscuros e indesejáveis, logicamente, mas assistir a isso tudo como espectadores é fascinante e, até certo ponto, consolador, visto que catártico.
O amor pode se transformar em tudo, até mesmo no que machuca e fere, da mesma forma nos transformando em pessoas melhores ou piores, mais felizes ou mais tristes, somando ou subtraindo. Caberá sempre e somente a nós lidar com um sentimento tão nobre, a ponto de aninhá-lo confortavelmente em nossos corações, sem dor, sem demora, sem espera, com verdade e conforto na alma.
Imagem de capa: Esquadrão Suicida (2016) – Dir. David Ayer