Imagem de capa: Kitja Kitja
Chovia torrencialmente naquela tarde e não era apenas do céu que a água caía com força. Um temporal escorria dos meus olhos e inundava um peito destroçado. A notícia da sua partida havia partido o que restava inteiro por aqui. O Caio, seu melhor amigo, me disse que você embarca hoje para Londres. Londres é longe demais e você não podia ir embora assim, para o outro lado do planeta, sem conhecer a imensidão dos meus sentimentos. Eu precisava olhar para você para lhe dizer tudo que vivia aqui dentro.
Eu sei, eu lhe disse “não” quando você bateu na porta da minha vida, mas eu estava confusa demais para te deixar entrar e por isso te mandei embora. Eu já te amava, mas fui covarde para assumir um sentimento desse tamanho. Pouco tempo depois outra te disse “sim” e um imenso sorriso lhe brotou nos lábios. E ali, naquele sorriso, eu percebi, tarde demais, que você era o que eu tinha de mais precioso. Entendi que a confusão só fazia sentido porque você sempre esteve presente. Inocente, eu acreditava numa espera utópica que não fazia sentido nenhum. Covarde, resolvi me calar e assisti você ser feliz sem mim.
Durante todos esses anos, ensaiei minha declaração de amor, preparei um discurso, planejei a conquista, escrevi cartas, ameacei ligações, mas estava assustada demais para colocar qualquer coisa em prática. Desisti de tentar. Eu já tinha desperdiçado a minha oportunidade. A culpa era só minha. Eu não tinha o direito de despejar em você todos os meus arrependimentos. Escolhi esperar, esperar você estar liberto para assim lhe entregar meu amor num embrulho bonito. Esperar. Esperar. Não havia mais tempo. Você partiria sem data de retorno e eu não suportava a ideia de viver sem lhe dizer que o seu amor floresceu dentro de mim.
Entrei no carro, enxuguei as lágrimas, respirei fundo e acelerei. Os radares não me impediram, o farol vermelho não me fez frear e eu larguei o volante assim que parei na porta do aeroporto. Eu corri. Corri o mais rápido que minhas pernas permitiram e busquei o Portão 3 com olhos secos e focados. Gritei seu nome, tropecei em malas alheias, busquei informações e encontrei o portão no exato instante em que seu avião levantava voo. De novo, tarde demais.
Outro temporal inundou meu peito e, no chão daquele aeroporto, entendi tudo. Eu não podia mais esperar. EU TE AMO. Te amo e preciso lhe dizer isso para desatar os nós que vem sufocando minha vida. Eu quero você com todo o meu viver, de uma maneira que você não faz ideia. O que sinto por você é lindo, intenso e forte o suficiente para me fazer deixar tudo para trás. Venho aqui para lhe entregar o que tenho de mais precioso: Meu amor por você. Venho cultivando tudo isso por anos e sei que essa é a hora de colocar para fora. Não sei qual será o resultado desse meu desatino, mas ele se faz necessário. Não importa se você vai correr para os meus braços ou para um Pub inglês. Não posso mais sufocar algo dessa importância. Esse amor não é só meu, também é seu. É justo que você tome posse.
Voltei para casa, fiz as malas, peguei o passaporte e entrei no avião cheia de coragem. Desembarquei em Londres numa noite quente e, com seu endereço no bolso, aluguei um carro. Dirigi por essa cidade estranha e mágica e parei na porta do seu novo apartamento. A luz da sua janela está acesa e já consigo imaginar a sua cara irritada por ter que desfazer as malas. Vou deixar essa carta e uma London Pride na sua porta. Beba a cerveja, leia com calma e, se ainda restar algum amor por mim aí dentro, me encontre no Starbucks da Nothing Hill Gate. Espero que não seja tarde demais.