Tornou-se pedra, a menina que um dia foi flor

Os dias mais marcantes são aqueles em que a gente sai deles um pouco modificados. São os dias que nos lembraremos para sempre, não importa quanto tempo passe. São os dias em que, sem anestesia alguma, somos confrontados com as verdades que nos fazem crescer, e de alguma maneira, enrijecer.

É preciso cuidado para não se blindar demais. Cuidado para não tornar pedra o que um dia foi flor. Cuidado para não deixar de acreditar na poesia, na delicadeza, no amor.

Todos nós passamos por sustos. Por momentos em que a vida nos dá uma rasteira e não sabemos mais em que solo pisamos. A gente se fere, se fecha, se ressente. Mas é preciso força para ser novamente semente. Para transformar pequenas gotas de orvalho em banho de chuva corrente. Para chorar mágoa e renascer flor. Para enxugar o pranto e cicatrizar a dor.

Não é de uma hora para outra que a gente endurece. A dor é cumulativa, e de tanto sentir o chão ruir, vamos nos fechando também.

Aos poucos fui tecida concreto, cimento e rocha. Aos poucos tornou-se pedra a menina que um dia foi flor.

Porém… Ninguém é feliz por inteiro quando perde a fé. Quando perde a esperança por dias risonhos e noites dançarinas. Quando não há transpiração nem emoção. Quando falta amor e sobra rancor.

Por isso e para isso existe o tempo. O tempo que sopra as feridas e afofa o solo árido de nossas crenças e emoções. O tempo que restaura a dor e seca o pranto. O tempo que possibilita que volte a ser flor o que um dia foi pedra.

Contrariando o que se esperava dela, a flor rasgou o chão. A flor rompeu a muralha de cimento e buscou a luz. A flor encontrou uma sutura mal feita na rocha e brotou inteira, forte e verdadeira, sob os raios de sol. A flor desafiou as intempéries da jornada e resistiu como alicerce de delicadeza e fortaleza.

Que haja mais motivos para ser flor do que pedra. Que minha alma não endureça a ponto de murchar diante do primeiro obstáculo, nem de perder o viço diante da aridez do terreno. Que não falte brisas de esperança, chuvas torrenciais de harmonia e luz abundante de calmaria.

Os dias mais marcantes são aqueles em que a vida contraria o óbvio. Em que os começos difíceis são massacrados pela força de um final feliz. Em que a brisa suave do pensamento leva embora um furacão de sentimentos. Dias em que a urgência de ser feliz aprende a ser calmaria do encantamento. E tempo em que toda a poesia grita em detrimento de todo barulho que há em mim…

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Fabíola Simões é dentista, mãe, influenciadora digital, youtuber e escritora – não necessariamente nessa ordem. Tem 4 livros publicados; um canal no Youtube onde dá dicas de filmes, séries e livros; e esse site, onde, juntamente com outros colunistas, publica textos semanalmente. Casada e mãe de um adolescente, trabalha há mais de 20 anos como Endodontista num Centro de Saúde em Campinas e, nas horas vagas, gosta de maratonar séries (Sex and the City, Gilmore Girls e The Office estão entre suas preferidas); beber vinho tinto; ler um bom livro e estar entre as pessoas que ama.

19 COMENTÁRIOS

  1. “Aos poucos fui tecida concreto, cimento e rocha.”

    Como sempre me identifico com seus textos. Tão humanos e verdadeiros que trazem a esperança de transformar o que se tornou pedra em flor.

  2. Acabei de virar pedra, rocha, as lágrimas não param de cair, perdi o chão, esse texto me diz que uma semente do que eu era, ainda está aqui em algum lugar e brotará novamente. Obrigada!

  3. Você é incrivelmente sensível e maravilhosamente especial, obrigada por esse texto, obrigada por entender e explicar cada sentimento sem tirar sua realidade, obrigada por existir … parabéns era tudo que eu precisava ler, virei fã não perderei nenhum post a partir de hoje…

  4. Lindo texto!!Tornou-se pedra a menina que um dia era flor…se encaixa em alguns momentos da vida de muitas mulheres.Me indentifiquei muito com o texto.
    Parabéns pelas lindas palavras!

  5. Oi Fabíola, parabéns pelo belíssimo texto! Este texto é tão mágico que ouso postar aqui uma letra de música (de minha autoria) intitulada “A palavra mágica”, para reverenciar seu talento e sua sensibilidade. A palavra mágica é chave, é senha, é alavanca, é asa, é tábua de salvação, é iluminação espiritual, é descoberta. A palavra mais comum pode ser mágica quando dita no momento certo, na hora certa, para a pessoa que precisa ouví-la. Qualquer palavra que tenha esse poder, torna-se mágica. Quando ouvida, mostra possibilidades, clareia caminhos, alimenta esperanças, reergue ânimos, transforma vidas. Cada pessoa tem sua palavra mágica – aquela que soa mais clara no fundo do seu ser. Essa palavra precisa ser dita, essa pessoa precisa ouví-la. Que o mundo e a vida promovam a alegria e a magia desse encontro. Finalizo reafirmando que seu texto é mágico. Aí vai a letra:

    A PALAVRA MÁGICA

    Certas palavras
    Abrem caminhos
    São chaves de vida
    São senhas de luz

    Cada vivente
    Uma palavra
    Que soa mais clara
    No fundo do ser

    Ave, palavra
    Pousa na vida
    Daquele que treme
    Com sede de ti

    Tantos te querem,
    Poucos te entendem:
    Desejos de lua,
    Abraços de sol

    Gire o mundo
    Nesse encontro:
    De vidas que a lancem
    De vidas que a colherão

    (Gilberto Ichihara)

    P.S.: comprei seu livro.

  6. E para mostrar o caminho inverso – da pedra para a flor – no meu texto simbolizada pelo coração, permita-me postar outra letra (de minha autoria), inspirada em Rubem Alves. Intitula-se “Pipoca”. Rubem Alves disse que, tal qual milho de pipoca, originalmente duro, precisamos passar pelo fogo das provas da vida para nos adquirirmos a maciez da pipoca. Após isto, a “pedra” que havia em nós se torna coração. Aí vai:

    PIPOCA (inspirada em Rubem Alves)

    a-ah, a-ah-ah
    a-ah-ah, a-ah
    a-ah, a-ah-ah
    a-ah-ah, a-ah

    pipoca que ontem foi milho
    pipoca, hoje algodão
    pipoca que ontem foi dura
    apura na mansidão

    o milho que nega fogo
    pipoca não vira não
    é dura que não dá jogo
    é massa que não dá pão

    de milho, dureza,
    joelho no chão,
    tornaste em beleza
    pipoca-algodão

    pipoca macia
    macio de pão
    a pedra que havia
    virou coração

    (Gilberto Ichihara)

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