Dentro da gente há inúmeros aposentos. Uns habitados por muitos. Outros habitados por poucos. Outros absolutamente vazios de outros, mas cheios de nós mesmos. Vamos sendo tecidos, fio a fio, pelas incontáveis conexões humanas que a vida nos apresenta. Somos uma trama de tudo o que vivemos, ainda que tenhamos vivido sós. Mas, os outros… Ahhh… os outros são o nosso tempero, norte e perdição.
Há os que vêm só de visita, aqueles que são deliciosos como um café recém passado numa tarde de chuvinha fina. Há os que duram o tempo de um dia ou dois, aqueles que são maravilhosos como uma viagem surpresa de fim de semana. Há os que permanecem como hóspedes bem-vindos de um país estrangeiro, são aqueles interessantes e instigantes como filmes argentinos. E há os que nos entremeiam e entrelaçam-se a nós pelo resto de nossos dias, são aqueles arrebatadores livros inesquecíveis, daqueles que lemos quando eles ainda eram “proibido” para nós.
E, rendamos a importância justa àqueles que embarcam em nossas vidas, seja de forma meteórica, sazonal ou histórica, com a indecifrável missão de nos desafiar. São os desafetos, os desaforados, os difíceis de digerir. A esses, devemos as mais importantes lições. Sem eles, seguiríamos a vida acreditando em nuvens de algodão doce, coelhos que pintam ovos de chocolate e, até, quem sabe, na bondade inerente ao ser humano.
Ahhh…sim, é fundamental termos fé em alguma coisa, ainda que essa coisa seja a bondade inerente ao ser humano, uma fantasia ou um mistério divino. O único pequeno problema nessa crença é que ela pode beirar a ingenuidade, caso não seja acompanhada de um importante empenho próprio em tomar nas mãos a responsabilidade sobre acertar e errar. Fé sem reflexão é uma máscara sem buraquinhos para os olhos, só servem se você pretende ficar adormecido como se o escuro da noite fosse durar para sempre.
No fim das contas a gente conta com poucos, mas esses poucos são os que contam pra gente. São aqueles que cabem direitinho nas lembranças e no presente e que não nos causam nenhum tipo de aflição ou angústia sobre o futuro. Porque a gente sabe que eles não vão durar para sempre aqui do lado de fora. Mas vão iluminar para sempre o nosso lado de dentro.