A última amarelinha que brincamos juntas na espreita da calçada eu não sei dizer quando foi. Assim como não sei dizer quando foi que eu e você crescemos em direções opostas.
Da cocada vendida de porta em porta, pela senhorinha sorridente e grisalha, eu também não me lembro da última vez que comprei. Mas o gostinho de infância e a lembrança dos dois dedinhos de prosa com a “Tia da cocada” ainda permanecem comigo.
O seu número eu ainda tenho, assim como sei que você tem o meu. Só não temos mais motivos para ligar um para outro. É que os números ficam o tempo não.
Posso até não saber exatamente onde, mas aquele papel de bala que ganhei antes de você partir, eu fiz questão de guardar. Partir para onde mesmo?
Da garotinha que se desmanchou em sorrisos para mim no meio da estação de trem lotada, nem com o nome eu fiquei. Não foi preciso para que ao menos eu a deixasse com o mesmo sorriso espontâneo em retribuição.
Quantas despedidas que não sabíamos ser a última cabem em uma vida?
De algumas eu me lembro como uma brisa mansa, outras foram ventania forte cortando a pele.
Mas isso foi ontem, e hoje?
Hoje também já devo ter tido grandes despedidas, que só com o tempo vou me dar conta.
E quanta vida cabe em tantas despedidas?
Eu nunca vou saber.
Mas vou vivendo cada uma delas displicentemente, sem a solenidade do adeus.
E com a certeza incômoda e esperançosa de já não ser o que era poucos instantes atrás.
Com a dor e a delícia de ser o que se é, no outro também.