Só – Fabrício Carpinejar

Solidão não é estar sozinho, mas é não conseguir ficar sozinho, não se suportar sozinho.

Assim como a solidão não tem conexão com o deserto e o isolamento. Pode acontecer casado, acompanhado, cheio de gente ao lado.

Solidão é uma insuficiência que cresce: é a infinita capacidade de piorar o mundo para melhorar as reclamações.

Solidão é não encontrar ânimo tanto para acordar quanto para dormir, é quando o desespero desemboca em angústia.

Solidão é guerrear com a imaginação, lutar com a memória, combater os pensamentos. É se posicionar contra o perdão.

Solidão é uma saudade de si.

Solidão é rir sem vontade mais do que ter vontade de chorar.

Solidão é parar de achar graça quando as coisas dão errado.

Solidão é não ser compreendido. É explicar o que machucou e não receber o curativo da atenção.

Solidão é ser desacreditado sempre que se conta a verdade. É revelar uma urgência e ser menosprezado.

É expor uma necessidade e não ser levado a sério.

Solidão é a incomunicabilidade. É conviver com alguém e não ter como falar o que incomoda, é perder o ritmo da confissão, é não saber mais como começar uma conversa.

Solidão é ser assaltado várias vezes pela mesma tristeza. É não resolver nunca o problema, é aceitar a falta de solução.

Solidão é jamais encerrar as mágoas, adiar a despedida para fingir que a relação não acabou.

Solidão é não terminar mais nenhum livro e ouvir uma única música ininterruptamente.

Solidão é forjar respostas para não enfrentar as perguntas.

Solidão é chegar muito atrasado na emoção. É um desabafo feito exclusivamente de soluços.

Solidão é ir substituindo a vida por mentiras, é ir substituindo o compromisso pelas desculpas.

Solidão é assumir a culpa por aquilo que não aconteceu e, ironicamente, fugir da responsabilidade por tudo aquilo que aconteceu.

Solidão é ser desajeitado para amar e ser incompetente para odiar.

Solidão é quando o silêncio vira fardo.

Solidão não é o vazio, é ocupar o coração pela pessoa errada.

Solidão é manter um quarto infantil para um filho adulto.

Solidão é lembrar o aniversário um dia depois.

Solidão é um asilo para crianças, um orfanato para velhos.

Solidão é desinteressar-se pelas palavras e, em seguida, desinteressar-se pelo corpo.

Solidão não é ausência de sexo, é ausência de prazer.

Solidão é extraviar o contato com a família e não ter a humildade de reatar.

Solidão é desaparecer para os amigos durante a alegria e depois ver os amigos desaparecendo nos momentos da tristeza.

Solidão é pagar mesada aos defeitos e salário para as dores e não sobrar nada para agradecer aos céus.

Solidão é enjoar de tudo o que antes lhe inspirava, é quando a felicidade transforma-se em tédio.

Solidão é rastejar com asas, não dispor da concentração mínima para recuperar o que era importante.

Solidão é não ser mais solidário consigo.

Solidão é recordar os bons momentos somente para se torturar.

Solidão é inventar doenças e morrer de desgosto pelo excesso de saúde.

Solidão é se sentir só ainda desejando estar só.

Publicado originalmente no Zero Hora, Caderno Donnavia Carpinejar



LIVRO NOVO



Blog oficial da escritora Fabíola Simões que, em 2015, publicou seu primeiro livro: "A Soma de todos Afetos".

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