Quando encontrar a dona Felicidade, não se acanhe em chamá-la pelo nome!

Eu nunca pensei no que faria se um dia trombasse com a dona Felicidade. Até que um dia eu a encontrei sem querer, em uma manhã sem sol, atrás do balcão de uma farmácia.

Era uma senhora de semblante gentil. Pesados óculos sobre a face e um jaleco branco. Sorria de forma cordial e respondia atenta a todas as dúvidas dos clientes adoentados. A dona Felicidade era prática e direta e assim o foi quando lhe perguntei sobre o nome em seu crachá. Nele lia-se “Felicidade Cristina”

Indaguei-lhe se esse era seu nome e ela me confirmou com um largo contentamento no olhar. Disse-me que não era para se chamar Felicidade, apenas Cristina, mas uma avó portuguesa havia falecido, daí os pais decidiram homenagear a matriarca.

Apesar de todas as recusas em assumir a beleza de seu nome eu não pude deixar de me alegrar por ele e em minha cabeça eu só pensava “que benditos foram seus pais dona Felicidade”, no entanto dona Felicidade emendou uma última explicação dizendo que ninguém a chamava de Felicidade. Que comumente, quando se dirigiam a ela, usavam o segundo nome ou o diminutivo dele.

Estava claro, a dona Felicidade não estava muito à vontade em ser felicidade. Pensei um pouco a respeito e finalmente compreendi o que ela estava tentando me dizer.

Por mais louco que possa parecer, muita gente tem receio de chamar a felicidade, tem receio de abraçá-la sem pudores, tem receio de dançar com a felicidade, como se a felicidade fosse uma coisa proibida, meio profana e vergonhosa. Como um riso estridente que salta para os ares chamando a atenção de olhos sisudos.

Então, eu pensei na dona Felicidade em algum bailinho da vida, assim de canto, sentada em uma cadeira, sem nenhum pretendente que a quisesse tirar para dançar. As amigas, a Tristeza, a Ansiedade, a Pressa, a Mentira todas elas estavam bailando livres, leves e soltas, só a dona Felicidade que não. Então a dona Felicidade quis esquecer que era felicidade e passou a dizer pro mundo que era só Cristina ou Cris. Como se fosse pecado ser feliz.

Dona Felicidade, eu me recuso a chamá-la de Cristina. Se eu a encontrasse na rua gritaria “Ei, dona Felicidade!”. Faria do mundo um lugar mais alegre, começando por você, começando por chamá-la pelo teu belo nome, dizendo-o estrondoso, para fazer inveja a todas essas tuas amigas que estão tão na moda. Fazendo inveja a todos os que tentam sufocá-la e extirpá-la do mundo para que as pessoas não lembrem que felicidade é coisa preciosa. Que toda felicidade é bonita de ver e sentir. Que felicidade é coisa bendita que não requer batida na madeira, nem superstição.

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Vanelli Doratioto é especialista em Neurociências e Comportamento. Escritora paulista, amante de museus, livros e pinturas que se deixa encantar facilmente pelo que há de mais genuíno nas pessoas. Ela acredita que palavras são mágicas, que através delas pode trazer pessoas, conceitos e lugares para bem pertinho do coração.

1 COMENTÁRIO

  1. Belíssimo texto de Vanelli Doratioto – Alcova Moderna, que todas pessoas sejam chamado por dona Felicidade e sem medo de ser feliz. Hoje mesmo eu fui fazer um pedido para minha mãe, de procura a amiga Telma para dá a contribuição da Igreja, acabei encontrando ela na rua, ai eu dei um grito bem alto para que ela e outras pessoas pudesse ouvir, a ainda acrescentei um tia para ela, sabe? ela me olhou com aquele sorriso, e agora lendo o texto, eu descobrir na tia Telma a dona Felicidade. beijos e abraços para todas as felicidades e para que os fazem feliz.

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