Ele me disse “deixa que eu cuido de tudo”. E eu me senti como se alguém tivesse me dito que cuidaria do fogo do abrigo meu. Que eu não precisava assoprá-lo por horas. Que eu podia finalmente descansar.
Ele me disse com um sorriso que tinha me encontrado atrás de um aperto de mão, de um cumprimento teatral e ensaiado. E eu sorri de minha total incapacidade de esconder-me de quem sabe enxergar.
Ele me disse com um olhar que tinha gostado de mim. Que me cuidaria junto com o seu tudo. Que eu podia finalmente confiar, que eu podia me apoiar em seu peito e adormecer. E eu o enlacei em mim em um abraço de almas.
Ele me disse com um toque que já me conhecia antes, não dessa, mas de outras vidas. Que fizesse eu o que fizesse, ele sabia quem eu realmente era e que me amava assim. Por tudo desde o princípio. Por todas minhas vidas em uma vida. Por todas minhas vidas em outras vidas.
Ele me disse que eu estava nele assim como ele em mim. Que um morava no outro e que sempre seria desse jeito. Que acontecesse o que acontecesse, estaríamos juntos. Que podíamos viver em qualquer lugar no mundo, pois como almas que éramos não sabíamos mensurar distâncias.
Ele me disse que eu era não um, mas todos os sonhos que lhe tomavam da realidade. E eu reconheci nele os meus enlevos mais doces e ousados, todos os cernes de minhas mais tímidas fantasias e loucas aspirações.
Ele me disse que gostava de tocar minhas pernas como a brisa e de bagunçar meus cabelos como o vento. E eu lhe disse em um aceno que ele em mim seria para sempre o impulso do amanhã. O café fresco para o dia. A saudade mansa e suave das primeiras horas da manhã.
Ele me disse do amanhã que é hoje. Eu lhe contei do hoje que foi ontem. Então todos os tempos se mesclaram em nós e ele descansou em mim. E assim seguimos, lado a lado, com as mãos enlaçadas por dentro, no avesso, exatamente onde podemos ser tudo de nós.
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