Tenho descoberto que sou grande interessada em física e filosofia. Fã de Marcelo Gleiser, que tive a alegria de conhecer pessoalmente na fila de autógrafos da última FLIP, o livro “A ilha do Conhecimento”, de sua autoria, tem me feito companhia nos últimos dias. Ainda não concluí a leitura _ pela mais pura falta de tempo _ mas, como de praxe, o livro encontra-se severamente sublinhado.
Numa das partes ele diz: “O teatro da existência se dá no cérebro”. E apesar da atividade incessante de nossos neurônios, o “cérebro é cego e surdo para informações que não aumentariam as chances de sobrevivência de nossos antepassados”.
Em outro capítulo diz: “A última palavra é sempre da Natureza: ela pouco se importa com nossos sonhos de perfeição ou beleza estética”.
O que pode ser um imenso alívio quando se trata de expectativas ou necessidade de controle. E pode explicar alguma coisa em se tratando do acaso ou eventos aleatórios que desencadeiam uma grande ocorrência.
Ao falarmos sobre o teatro da existência, falamos sobre a percepção que temos do mundo ao nosso redor, e o que esse mundo nos oferece ou deixa de oferecer. Como reagimos ao que falta ou sobra em nossas vidas.
Nosso cérebro capta uma realidade severamente incompleta, e formula sua concepção diante do todo da forma que lhe é mais conveniente para sua auto proteção e preservação.
Como no filme “A Culpa é das estrelas”, há uma quantidade infinita de números entre o zero e o um, e muito mais entre o zero e o dois. Há o 0,1; o 0,12; o 0,112…
Assim, por mais que enxerguemos somente o zero, o um e o dois, entre eles há uma outra infinidade de números que também ditam as regras de nossa existência _ os percalços e falhas, as vitórias e a boa sorte _ e nem nos damos conta, acostumados a lidar somente com a realidade a que fomos condicionados a experimentar.
O teatro da existência consiste na forma como lidamos com aquilo que interpretamos como realidade. Porém, a realidade não é só aquilo que nossos sentidos captam; mas algo muito maior, em constante harmonia ou desarmonia com o Universo. Dar sentido a esse teatro cabe a cada um, do jeito que lhe é mais conveniente.
Porém, nem sempre encenamos as peças que desejamos.
Tentar ‘dançar conforme a música’ é buscar, de algum modo, equilibrar nossas vidas. Porém, colidir diretamente com aquilo que não está fluindo é varrer poeira contra o vento. Mais ou menos como escrever e encenar um teatro desgastante e desnecessário; com muito drama, suor e lágrimas pra pouco conteúdo e consistência.
“O modo como cada pessoa escolhe se relacionar com essa escuridão define _ ao menos de forma geral _ como cada um vê a vida e seus mistérios” escreveu Gleiser.
As religiões vieram amparar esse medo perante a Natureza, o Universo, a existência. A fé traz esperança, ao segurar-nos pelas mãos e carinhosamente afirmar que existe uma Verdade Final. O teatro da existência ganha sentido quando acreditamos nessa Verdade, capaz de justificar e amparar todo sofrimento e angústia que ‘O Existir’ traz.
O teatro da existência ocorre no cérebro. Dessa forma, deveríamos criar espaços internos que nos permitissem ter um recanto de paz, longe de todo barulho que a realidade dos sentidos traz.
Nunca fiz meditação e me arrisquei pouco na Yoga, mas imagino que criar espaços internos seja como meditar ou orar.
Como a oração é a única prática que conheço, acredito que é uma forma de estar em sintonia com a Natureza, com a Verdade, com o Todo a que faço parte.
Aceitar o desconhecido, aquilo que não fomos condicionados a enxergar, é difícil. Segundo as palavras do filósofo Heráclito: “A Natureza ama esconder-se”. Assim, a busca por uma conexão com a Verdade é uma busca corajosa, que implica deixar antigas concepções de lado _ romper o vínculo com o conforto _ e arriscar-se numa profunda e dolorosa mudança de perspectiva.
O Deus que habita em mim e no qual acredito, é um Deus de Amor. Um Deus que não pune, mas acolhe. Um Deus que não pede sacrifícios, mas aceita o pecador. Se estar em harmonia com esse Deus me coloca em confronto com alguns dogmas que me ensinaram no decorrer da vida, é perante esses dogmas que minha realidade mudou.
E mais uma vez cito Adélia Prado, a quem Padre Fábio de Melo dedica seu último livro com a seguinte frase: “Para Adélia Prado que, na intimidade de sua casa, confessou-me um desconsolo comovente: ‘Esqueceram de nos contar que Deus é amor'”.
Esqueceram de nos contar que Deus é amor, que nós somos e carregamos a partícula divina; que a Verdade acolhe e não segrega; que o Amor abrange, e não distingue.
Ao compreender a verdade de que ao pecador também é reservado o direito de sentir-se amado por Deus, sinto-me em paz e amparada por tranquila certeza.
Por permitir-me abrir compartimentos trancados de intuição e completude ao Todo que nos rege.
Por modificar a perspectiva que tenho do mundo e das pessoas.
Por descobrir que falhas nos permitem avançar.
E finalmente, por constatar que o que importa realmente é aquilo que ainda não sabemos ou estamos impossibilitados de enxergar _ os tais números entre o zero e o um, ou entre o um e o um milhão.“O essencial é invisível aos olhos…”
Fabíola, diante dessa linda imagem o que você vê? Árvore, chuva, botões? Posso ver círculos, coloridos, mas círculos fechados. Eles podem pairar em diversos ares, curiosos, mas são círculos. Quisera que o Deus os rompesse para se tornarem nuvem de realidades outras, mas se a inovação começa na mente, o que fazer? A mente está dentro do círculo.
Sim, "quisera que o Deus os rompesse para se tornarem nuvem de realidades outras…" lindo, poético, verdadeiro! Obrigada por comentar, muito inteligente e complementar sua observação, ainda que eu não tenha atentado para tudo isso ao escolher a imagem. Obrigada! Bjs anônimo!
Fabíola, filosofar e meditar são nossas tarefas mais úteis. São o que verdadeiramente nos ratifica a humanidade e pode-nos levar à trancendência.
Surpreendo-me que a ilustre escritora Adélia Prado seja do tempo do Deus – temor, pois há trinta anos aprendi e ensinei a muitos – não sem questionar – o amor "exagerado" do pai do filho pródigo, na Bíblia, a representar Deus. Este espera a volta do filho pecador.Aquele que se afasta. No entanto, tb. sabemos que o pai que ama disciplina seu filho. Deus é bom mas não é bobo. Já senti e sei como é duro ser disciplinado por Deus. Mas aceitei e sempre aceitarei Sua correção, pois o Pai que ama corrige. Pense nisso. Parabéns por nos levar a pensar.
Olá Fabíola sempre acompanho seu blog e seus textos tem muita sensibilidade. Não sei parece uma mensagem de Deus mesmo. Estou numa situação muito delicada e tem me ajudado muito.
Obrigada pelo carinho de compartilhar seus sentimentos.
Abrcs
Carina