Quando eu era pequeno, minha mãe sempre dizia – Não se perca de mim! – e eu nunca entendi o que ela queria dizer. Pensava que ela queria evitar que eu sumisse na multidão e tivesse que ser chamado pelo microfone atrás do palco, ou ainda que eu me afastasse um pouco e fosse criado por uma família de ciganos. Minha avó dizia algo sobre isto, sobre ser criado por uma família de ciganos e isso também me encantava internamente.
Mais velhos, nós descobrimos que quando uma pessoa se perde, pode ser assustador, mas que mais pavoroso é a sensação de duas pessoas que se perdem, não na rua, ou no shopping, mas na vida. Dói, mas faz parte do amadurecer: limpar as folhas secas, que hoje só lembram vida, para que a vida real brote em nós. Todos os grandes sábios disseram isso. Sabedoria é a elegância nata diante da dor.
E assim doeu quando percebi que nem todos que nos amam nos fazem bem. E também doeu quando percebi que o ego pode matar a amizade. E doeu ainda mais quando senti que estava perdendo, por entre os dedos, gente que já amei e para quem me dediquei com toda a vontade e fé.
E a vida vai nos desmontando, remodelando, nos completando de alguma coisa, como uma criança criando formas na areia. Já amamos pessoas que não sentem mais a nossa falta, que não nos dirigem mais a voz, que não se dizem mais nossos.
Eu ando balançando o galho. Sem essa de nos prendermos às migalhas de relações falidas ou injustas, desde o princípio. Apagar, a gente não apaga ninguém. No máximo afasta-se a imagem, a lembrança rotineira de alguém com quem já dividimos amor, amizade, vida. Crescer dói, seja aqui, aí, ou numa família de ciganos.