“Felicidade é discreta, silenciosa e frágil, como a bolha de sabão. Vai-se muito rápido, mas sempre se podem assoprar outras.” Rubem Alves
Certa vez viajei para um paraíso na costa da Austrália, e após alguns dias sem dar notícias, uma amiga me escreveu preocupada: “E aí, Antônia, não está gostando da viagem?” – não entendendo a pergunta, respondi prontamente, “Poxa, é claro que estou. Da onde você tirou essa ideia?”. Ela então, concluiu sua lógica – “ah, é que você não postou nada a respeito, achei que não estivesse se divertindo”. A lógica dela, que é a lógica da maioria (incluindo a minha), me fez pensar. Estaríamos tão acostumados a propagar nossa alegria, que desaprendemos a reconhecer a felicidade silenciosa?
Felicidade silenciosa. É assim que eu chamo aqueles momentos da vida em que não faz a menor diferença se o celular tem bateria ou não. Sabe? A turma certa, a beira de praia perfeita, o boteco no meio da semana, o sítio com os irmãos, os lençóis cheios de delícias, o livro novo, o dia de ser boa companhia pra si mesma(o). Momentos onde a beleza de ser e estar é tão sublime, que ninguém fora destes pequenos universos precisa ficar sabendo. Talvez ela aconteça por medo de que os holofotes ofusquem quem enxerga estas maravilhas. Ou ainda por conta de quem teme o olho gordo. A minha teoria reina na simplicidade da distração. Felicidade silenciosa ocorre por pura distração. Algo do tipo, “opa, esqueci de viver o online pros outros, enquanto vivia o off-line pra mim”.
“Ora, ora, não seja hipócrita, Antônia!”. Sim. É claro que as fotos da minha viagem estão no meu perfil, obvio que eu faço check-in em lugares bacanas e divido meus momentos de emoção com minha audiência preferida em inúmeras ocasiões. Sem dúvidas sou uma daquelas pessoas que gosta de compartilhar onde foi, o que viu, como viveu (afinal, eu tenho um blog!). Todo mundo é um pouco assim. Entretanto, verdade também é que nada me distrai mais que a felicidade silenciosa. Eu adoro me perder em ruas que desconheço mundo afora e memorizar os cheiros e as sensações. Eu deixo o celular fora do quarto pra me perder nas curvas de alguém que me tira a atenção. Amo e prefiro contar minhas aventuras pessoalmente, pra aqueles que gostam de me ouvir vendo a emoção nos meus olhos e não no brilho de uma tela. Quando não me encontram no celular, quem me conhece já sabe e canta a pedra “está por aí aprontando alegria e sendo feliz!”. E estão certos.
Penso que a felicidade silenciosa é aquela mais egoísta, sabe? Alguns momentos de contemplação da vida que merecem ser divididos com poucos, ao invés de serem lançados no vento para muitos. A felicidade silenciosa é como um bem valioso – você não sai desfilando com ela pendurada no pescoço. Você guarda numa caixa de jóias dentro do coração. Cada risada de doer a barriga com sua melhor amiga. Cada suspiro arrancado por um amor. O colo da sua mãe (mesmo aos 30!). E todo sorriso que não pode ser reproduzido para a prosperidade. Para estes casos de felicidade silenciosa, não precisa de registro oficial. Porque quando eu ficar bem velhinha, quero lembrar-me de como eu me senti, e não de quantas fotos tirei. E para isso a minha atenção tem que ser dedicada.
Felicidade silenciosa para os outros, mas que clama dentro da alma. Eu sei que quando a gente está feliz, quer gritar essa condição aos quatro cantos do mundo e que nos dias de hoje a tarefa de fazê-lo realmente é possível. Preste atenção, entretanto, que a felicidade silenciosa se basta em existir. Sobrevive dos sussurros de amor e juras menos dramáticas. É propagado em grupos menores, entre abraços que falam mais que palavras. Não precisa de conexão wi-fi. Não é transmitida em um tweet e certamente não tem filtros. Ela é pura. Sincera e por vezes tão rara. Então não se deixe distrair pelos gritos de euforia no mainstream da felicidade pública. Preste atenção na felicidade silenciosa. O resto é só barulho.