O amor é azul da cor do céu

Imagem de capa: FCSCAFEINE, Shutterstock

Era a hora de quebrar o encanto diante da madrugada anunciada e propor a permuta. “Dou-me inteira em troca de um belo passeio entre as nuvens”. Então, sem mover as pestanas encostou-lhe a boca na orelha e sussurrou meias palavras enquanto arrancava-lhe o vestido plissado – junto de seus paralogismos.

Ela, petrificada, caiu em seus braços aceitando o incontestável: desejava o céu azul da boca que fitava. Seus membros inferiores – antes comandados pelo fêmur, estavam entregues aos lábios que se moviam com irrupção. Com a ígnea inflamação de poros e cheiros nem mesmo se incomodou com tamanha incursão.

Envolveu seu corpo inteiro num abraço profundo. Calou os medos no barulho de um sussurro. Mordeu sua nuca como quem morde um morango maduro – que vai se encaixando perene na boca, até virar líquido.

E queimou na fogueira do desejo.

Foi então que o corpo dela vibrou no ritmo de um samba enredo. Foi então que o corpo dela levitou no esgotamento de uma longa noite. O corpo dela tremeu inteiro. Festeiro, suou. E molhou. E calou-se por completo como o fim de um tango que se dançou sem medo.

“Leve-me ao céu, leve-me ao céu” – clamava a donzela. Na coalizão dos corpos, um sobre o outro, o movimento era rítmico, assistemático, insolente. Desenfreada invasão de saliva (s).

Não é apenas desejo, eles já sabiam disso. Há algo maior entre o céu e a terra, uma dimensão de paixão programada para dar certo antes do início do mundo. Alguns encontros acontecem assim, tão sublimes que poderiam passar despercebidos não fosse a explosão dos corpos quando se cruzam a primeira vez.

“Somos um só”, falaram juntos antes do fim do primeiro ato. Sem plateia, sem flashes, sem produção. O palco nu e inteiro recebeu festeiro o casal de um. Seguiram amantes do tempo e como uma canção de uma única nota: valsaram no chão duro e frio – como se dançassem nas nuvens macias que cobrem o sol todos os dias enquanto se amam.

E as bocas perscrutavam por uma brecha de respiro. Faltava-lhe o ar. Que loucura acontece quando os desejos se cruzam? Na dificuldade do desencaixe, no atrito entre as pernas molhadas de água com sal, ela suspira na entrega sem fim.

E fim.

A valsa acabou e a cidade acordou. “Pshiiii, silêncio” – disse ele ao tempo, enquanto recostava a amada em seus braços. A doce donzela não quis saber a hora nem o que viria depois daquilo. Ela só pensava no que havia descoberto aquela noite.

“Que azul é o céu tão de perto”, disse baixinho.



LIVRO NOVO



Não nasci poeta, nasci amor e, por ser assim, virei poeta. Gosto quando alguém se apropria do meu texto como se fosse seu. É como se um pedaço que é meu por direito coubesse perfeitamente no outro. Divido e compartilho sem economia. Eu só quero saber o que realmente importa: toquei alguém? É isso que eu vim fazer no mundo.

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