O vento toca os jardins do meu eu e anuncia, com um cheiro adocicado de terra, que a chuva vem e junto dela…você.
O tempo balança as folhas das árvores e o sol se move no céu com uma velocidade desconcertante.
Pessoas caminham afoitas por trilhas de uma vida agitada. Animais se lançam sobre árvores frondosas, sobre pedras reconfortantes, sobre caminhos mornos emitindo sons frenéticos, mas a música dos meus dias é composta pela melodia das tuas palavras em mim.
Cada uma delas está tatuada no meu inverso. Uma por uma estão todas grafadas em minha pele, do lado de dentro.
A vida segue. A vida se desenha no entorno das minhas lembranças em ti e o modo como me levanto cada manhã me diz que pouco aprendi sobre a forma certa de empostar meu corpo para a vida.
Na estrada de terra da colina do meu eu há uma capela azul. Uma capela que no passado foi ofertada à Virgem. Nela, em seus reservados bancos, entrego-me em contentamento e faço o tempo se acalmar.
As contas das minhas mãos repassam as passagens das tuas horas em mim. E hoje o vento lá fora, em um doce gemido, me faz lembrar o nome teu. Ele empurra as folhas para dentro e faz com que elas dancem lindamente. E elas carinhosas dizem-me que você finalmente encontrou-me.
Tudo sempre conspirou para que esse momento não chegasse, tudo conspirou para que o tempo apagasse todas minhas marcas em ti. Mas hoje não, hoje o tempo me diz matreiro que seus passos caminham até aqui.
O tempo me diz de sua presença súbita e eu sentada junto de minhas lembranças não precisarei me virar para saber de ti quando aqui entrar. Eu não precisarei levantar a cabeça para saber que você chegou.
Quando o teu primeiro passo tocar os degraus das minhas aspirações, o vento cessará, os bichos se calarão e virarão as cabeças em torpor, as nuvens congelarão no céu.
Eu não terei a necessidade de acreditar otimista que me reconhecerá, pois onde estou só pode chegar quem sabe o que busca.
E quando você se aproximar de mim, com passos mansos e serenos, eu saberei do sol que se deitará vagaroso e da chuva mansa que começará lá fora.
Quando meus olhos contemplarem os teus pés sagrados e percorrerem teu corpo dourado eles saberão o milagre que é.
Quando me puxar pelas mãos, lerei nos teus olhos a alegria de ter finalmente me encontrado. Eu enxergarei no teu sorriso a felicidade de se ver inteiro em mim.
Eu decifrarei então os desenhos do teu corpo e você desvendará os meus abrindo os caminhos da minha alma e dedilhando-a como quem recebe nas mãos um precioso diário.
E serão tantas as palavras que pedirão permissão para serem ditas que nenhuma delas será capaz de escapulir dos lábios nossos. Então nada diremos, apenas nos contemplaremos deslumbrados e o mundo saberá que estaremos em júbilo.
E ao te fitar não irei me conter. Com as mãos percorrerei teus cabelos castanhos e ao tocar teus olhos verdes com a ponta dos dedos guardarei demorada a tua face, tratando de gravá-la em mim, completando as lacunas que o tempo deixou.
Beijarei teus lábios e tomarei deles todas as tuas explicações sobre os desencontros que nos assopraram para tão longe de nós e deixarei que me abrace forte, deixarei que me embale demorado sem nada dizermos.
E lá fora o mundo estará festejando com água os confetes de um encontro de dois que se buscaram por muito tempo. E será então a nossa hora de caminhar para fora de mãos dadas como sempre estivemos, mesmo quando sós.
Juntos passaremos pelos bancos vazios como quem passa pelas pessoas mais queridas do passado e diremos que não foi em vão. Diremos que finalmente nos encontramos como havíamos prometido. E todos baterão palmas para nós e jogarão para o alto pétalas e grãos de arroz que lá fora irão se misturar com a chuva fina do fim de tarde.
E eu não vou me importar com a água do mundo, com as nuvens que choram o tempo, pois assim como elas estarei vertendo sorrisos pelos olhos meus, estarei chorando de felicidade e tratarei de comemorar ao teu lado a alegria serena de sermos inteiros outra vez.
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