Ela apareceu na porta da minha casa tarde da noite, com cabelos desgrenhados, uma blusa branca amarrotada e chinelos iguaizinhos aos que minha avó usava. Nova no prédio, recém mudada e sem açúcar para o café.
Foi questão de segundos, 1 ou 2, antes mesmo de reparar no cabelo, na blusa e nos chinelos velhos, me apaixonei. Por ironia do destino e para contrariar minha mãe, que sempre disse que o amor não bate na porta, veja bem, o meu bateu.
Dois dias depois, acho que foi assim, ela devolveu o açúcar junto de um chocolate. E retribuí no outro dia com uma cesta de frutas. Daí para o primeiro café juntos foi um pulo. Menos de um mês, talvez.
Ela tem uma forma de ver a vida que me faz querer ouvi-la por horas e horas sem pausa, sabe? Troco qualquer filme por um punhado de histórias sobre ela. Gosto quando ela abre a janela pela manhã e agradece a Deus pelo simples fato de estar viva.
E eu agradeço baixinho por estar ali diante de criador e criatura. E fecho meus olhos por alguns minutos pedindo ao universo que essa cena seja a mesma nos próximos cem anos. E o primeiro abraço da manhã acontece ainda na janela, abençoado pelo astro rei do Sistema Solar. E aí eu entendo porque o Sol é a estrela mais próxima da terra: unicamente para iluminar a pele dela.
Pele macia, – que quando toca a minha causa explosão. E é um bum de cores, cheiros e sabores. É um tum que dá no peito, mexe por dentro, arrepia o corpo todo. E a gente ama, se enrola, se esfola em alegria, em suor e sussurros.
Adoro quando ela para tudo só para olhar nos meus olhos, olha tão fundo que quase me cega. E minha retina filma em segredo cada ponto da sua íris, – que dilata e me reflete como um espelho da alma. Me vejo ali. E me reconheço inteiro naquela que é a minha melhor parte.
E do seu bom dia ao seu boa noite, entre beijos, saudades e anseios, perdoamos nossas falhas, desculpamos nossos erros e nos prometemos exatamente aquilo que podemos cumprir: aceitar nossa humanidade e toda passividade que o amor provoca, que o amor pede, que o amor devolve.
Se o amor bateu na minha porta por conta de um punhado de açúcar, não resta dúvida, – e disso tenho certeza: esse é o encontro mais doce de todos os tempos. E nem o próprio tempo, e nem o vento e nem as contraturas do coração, e nem mais nada que venha, poderão apagar nossa história.
Hoje eu sei que nasci de novo no momento exato em que você bateu três vezes na porta da minha casa. E eu renasço todas as vezes que você me beija e todos os dias que a gente festeja o entrelaçar de mãos de toda manhã, o cansaço dos pés ao final do dia, o encontro dos corpos na calada da noite e o dormir abraçado, colado, completamente agradecidos por estar ali, sabendo que não haveria outro lugar para ser feliz.
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