“Invejosa” (Netflix, 2024) é meu tipo de série: leve, espirituosa, divertida. A protagonista, Vicky, carrega o adjetivo que dá nome à série, mas, nem por isso, não ganha nosso afeto. Pelo contrário, ao expôr sua humanidade de forma tão verdadeira, cativante e muito engraçada, nos conquista nos primeiros 5 minutos.
O que Vicky tem de tão especial e que causa afinidade e proximidade – como se ela e nós, meros espectadores, fôssemos velhos conhecidos – é a capacidade de se desnudar e ficar vulnerável a cada instante, sem medo de expôr suas fragilidades e humanidade.
Porém, se diante do espectador Vicky se revela e mostra quem realmente é, diante de seus pretendentes ela não age de forma tão espontânea ou honesta. Por medo de não conseguir um marido – já que tem 40 anos e todas as suas amigas estão casando – Vicky faz de tudo para corresponder ao que esperam dela. Assim, se ajusta para caber no molde que cada candidato a marido espera de uma mulher.
Em dado momento, duas amigas de Vicky comentam: “Parece que Vicky nunca teve personalidade. Sempre se adapta ao que os namorados querem ver. Está lembrada do Nari, o punk? Ela fez um moicano. E o do Opus Dei? Ela comprou um rosário, ia à igreja. Com o Dani, ela era dona de casa, num condomínio fechado. E com Nicolás, uma mulher livre, que não faz perguntas. Ela é assim. É uma coisa mal resolvida… O único com quem ela não é assim, é com o Matías. Ele a ama do jeito que é. Não precisa fazer nada para ele a querer”
Nicolás deseja uma relação “leve”. E Vicky, obcecada por se casar e ter uma família, finge que é uma mulher livre, que aceita uma relação casual. Porém, a cada telefonema não atendido e a cada compromisso desmarcado em cima da hora, Vicky se despedaça. Se despedaça e não cobra, não exige, não se descabela e não demostra quem realmente é – por medo de perdê-lo.
As amigas tentam abrir seus olhos, mas ela não quer enxergar. Não quer enxergar que relações saudáveis não exigem que você seja quem não é, só para manter o outro ao seu lado. Relações saudáveis não fazem você ter medo de perder a pessoa que se relaciona com você quando você diz que algo a (o) machuca. Relações saudáveis não fazem você ter medo de ser punida (o) com o castigo do silêncio quando você impõe limites. Relações saudáveis não fazem o outro desistir de você quando você é você mesmo, de verdade.
Nicolás não amava Vicky, e sim o que ela podia proporcionar a ele. Não tinha paciência para ouvir seus dramas, não tinha tempo para escutar o que era importante para ela, não estava disposto a saber quem ela era de verdade e o que ela valorizava acima de tudo.
Quem desiste de você quando você mostra quem você é de verdade, não merece andar ao seu lado. Quem desiste de você quando você se mostra vulnerável e fragilizado, talvez nunca quis estar com você de fato.
Se você tem que fingir ser quem não é, para manter o outro perto de você… se você tem que fazer esforços sobre – humanos para o outro não desistir de você… se você tem que evitar falar de dramas e problemas, para o outro não enjoar de você… se você tem que fingir que não liga, que não machuca e que não tira a sua paz para o outro permanecer… então está na hora de você repensar sua ideia de amor. Será que o outro te ama ou ama o que você pode proporcionar? E você? Se ama o suficiente?
Nunca se culpe por ter sido de verdade. Por ter exposto suas fragilidades do mesmo modo que expôs suas virtudes. Por ter amado e se despedaçado. Por ter estabelecido limites. Por ter ficado ao seu lado e cuidado de sua saúde mental. Por ter pedido perdão. Por ter tentado dialogar. Por ter insistido. E, finalmente, por ter desistido…
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