A indulgência excessiva dos pais na criação dos filhos está pavimentando o caminho para o surgimento de uma geração de adultos que se mostram desorientados e incapazes de enfrentar as adversidades do cotidiano. Durante um almoço em família, enquanto João implora pelo celular da mãe para se distrair, Maria protagoniza uma cena de birra em uma loja de brinquedos exigindo que seu pai compre a boneca desejada imediatamente. Da mesma forma, Pedro demonstra irritação com a demora de seus pais em decidir sobre sua ida a uma festa. Estas atitudes, aparentemente inofensivas na infância, refletem uma realidade preocupante: estão se formando adultos que não sabem lidar com a frustração.
O cerne do problema, segundo a psicóloga e educadora Rosely Sayão, reside no imediatismo que permeia as relações contemporâneas. A facilidade com que os desejos são atendidos acaba por alienar os jovens da realidade, preparando-os inadequadamente para os desafios da vida adulta. A coach de vida e carreira Ana Raia observa que os pais de hoje lutam com a dificuldade de adiar a gratificação de seus filhos, um contraste marcante em relação a gerações passadas que viam valor em um “não” ou “vou pensar” como resposta.
O papel da tecnologia nesse cenário é duplamente significativo. A disponibilidade imediata de informações e soluções ao alcance de um toque na tela do celular tem contribuído para uma intolerância coletiva à incerteza e ao desconforto. A busca incessante por felicidade e a incapacidade de lidar com o descontentamento são sintomas de uma sociedade que valoriza o prazer imediato em detrimento da reflexão e da paciência.
A importância de aprender a lidar com o tédio e a frustração é reforçada por Daniel Becker, médico e fundador do projeto Pediatria Integral. Ele alerta para as consequências de uma infância repleta de entretenimento constante, sem espaço para a ociosidade criativa, que é essencial para o desenvolvimento da capacidade de inovação e da inteligência emocional. A interação limitada com o mundo real, substituída pelo tempo de tela, pode resultar em adultos com empatia reduzida e dificuldades de comunicação.
Contrastando com a visão de que dispositivos eletrônicos podem ser uma ferramenta educativa, Rosely Sayão critica o uso de celulares e tablets como muletas para apaziguar comportamentos disruptivos em contextos sociais, tachando essa prática de comodismo por parte dos pais. A solução, sugere o pediatra Daniel Becker, reside no estabelecimento de acordos claros com as crianças, equilibrando o tempo de uso de eletrônicos com a participação em conversas e atividades familiares.
Diante desse panorama, especialistas como Hany Simon, pediatra e presidente do Congresso Brasileiro de Urgências e Emergências Pediátricas, apontam a ansiedade e a angústia na adolescência e na vida adulta como possíveis consequências desse imediatismo observado na infância. Rosely Sayão conclui, enfatizando a necessidade de uma educação que prepare os jovens para a realidade, substituindo o princípio do prazer pelo princípio da realidade. Procure ajuda, se for o caso. Esta abordagem não apenas promove a resiliência diante das frustrações mas também prepara a próxima geração para enfrentar os desafios da vida com mais sabedoria e equilíbrio.
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