Maravilhada. Se existe um termo que possa definir a forma como fiquei após assistir “Are You There God? It’s Me, Margaret” (“Você está aí Deus? Sou eu, Margareth” em livre tradução no Brasil como “Crescendo juntas”), é esse. Há tempos um filme não arrancava sorrisos do meu rosto com tanta facilidade, ou me conduzia à doces memórias com tamanha maestria.
Margareth, a personagem principal (interpretada impecavelmente pela carismática Abby Ryder Fortson), é uma menina de 11 anos que está amadurecendo enquanto busca se comunicar com Deus à sua maneira. O filme, baseado em um livro de Judy Blume, retrata a trajetória de Margareth de forma sensível e emocionante – em diversos momentos tive que dar pausa na tevê e me recompor antes de prosseguir.
Abby Ryder Fortson, a atriz mirim, conseguiu acessar camadas de mim mesma que eu nem sabia existir e me fez recordar as pequenas alegrias que passam desapercebidas – camufladas pelas demandas do cotidiano – e se intercalam na minha vida e na de todos.
A fé de Margareth oscila conforme as coisas vão dando certo ou errado em sua vida. E ela se aproxima ou se afasta de Deus com frases do tipo: “está aí, Deus? Sou eu, a Margareth. Está tudo dando errado. Tudo. Estou implorando. Faça alguma coisa acontecer…” ou: “ainda está aí, Deus? Sou eu, a Margareth. Obrigada. Muito obrigada”.
Se eu fosse Deus, ou se fosse possível ajudar Margareth, eu diria que tudo passa. Altos e baixos causam desconforto, mas já imaginou a vida sem nenhuma dificuldade ou privação? Natal de segunda a sexta, casa cheia de primos do nascer ao pôr do sol, capuccino com chantilly todas manhãs, nota de cinquenta reais achada por acaso no bolso da calça diariamente?
Se você ganhasse na loteria todos os dias, que graça teria? A vida gosta mesmo de oscilar, andar em linha reta é entediante e não nos ensina a valorizar os pequenos prazeres da existência.
Sabe, Margareth, o mundo acaba todos os dias. Acaba quando aquela mensagem não chega, quando o pior diagnóstico se confirma, quando o dedo bate na quina. A boa notícia é que o mundo também recomeça diariamente. Recomeça quando a música preferida toca no rádio, a visita inesperada chega perfumando a casa, o remédio alivia a dor, o abraço afasta o pesadelo, a defesa do goleiro no último pênalti garante o tetracampeonato mundial.
É ilusão querer ter a vida sob controle. Um dia você vai estar atrasada e o ônibus, lotado, não irá parar para você subir. A espinha vai inflamar na hora do date, e a chuva não dará trégua no fim de semana na praia. Outro dia, porém, alguém a alcançará com o guarda-chuva aberto, e você agradecerá por ter seus pais com saúde. A calça jeans vai servir e você será aprovada naquele concurso. A vida não anda em linha reta.
Viver é estar finalizando um quebra-cabeças de 5000 peças e ser surpreendido com as mãozinhas do sobrinho desmanchando tudo. É começar um jantar especial e perceber que acabou o gás. É fazer contas para fechar o mês e descobrir dinheiro no fundo de uma meia. É planejar o futuro inteiro e perceber que só se vive um dia de cada vez.
A gente perde a fé quando não passa naquele concurso, mas a recupera, ainda mais forte, quando é elogiado na entrevista de emprego. Brindamos aos recomeços e perdemos a esperança quando a mensagem esperada não chega. Comemoramos a vitória do time e choramos, arrasados, quando nossos planos não coincidem com os planos de Deus.
Tudo passa, Margareth. Então o jeito é entender que momentos bons devem ser sugados até a última gota, pois eles irão passar e um dia serão só memórias. Igualmente, nenhum pranto será eterno e a melhor maneira de sair ileso é dançar conforme a música. A vida, definitivamente, não anda em linha reta…
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