Eu sempre fui meio solitário, desde criança. Eu adorava brincar sozinho, com meus bonecos, inventando roteiros de filmes. O quintal da casa de meus pais era enorme e lá eu passava horas comigo mesmo e com minha imaginação fértil. Meus gibis, naquela época, eram meus amigos inseparáveis.
Na sala da frente, havia uma estante cheia de livros. Minha mãe amava leituras, músicas e filmes. Isso dela entrou em mim. E lá eu ficava olhando os livros, folheando-os, lendo as orelhas. Lembro-me de muitas obras, ainda sinto aquele cheiro delicioso de livros antigos.
Isso me ajudou a ficar sozinho sem dramas, como uma decisão tomada por mim. Óbvio que não sou um ermitão e sempre cultivei amizades, mas me reservo um tempinho comigo mesmo todos os dias. Assisto a algo na Netflix, dedilho meu piano, ouço minha playlist de sempre. Nesses momentos, eu reflito, eu me desconstruo e me reconstruo, me decomponho e me recomponho. É terapêutico.
O mundo de hoje, por sua vez, é meio solitário, com seus relacionamentos virtuais líquidos, seu egoísmo crescente e uma violência que quase nos obriga a ficar com medo de sair lá fora. É necessidade essencial, por isso, aprender a ficar sozinho, a contar com si mesmo, afinal, a competitividade que adentra em todos os setores da vida nos faz hesitar em pedir ajuda, em nos abrir para as pessoas.
Hoje, eu já consigo me bastar em muitos aspectos, sem precisar da aprovação dos outros, sem ligar muito para o que elas irão pensar se eu fizer ou disser algo. Não consigo mais fingir sentimentos. Passei muito tempo tentando poupar os outros enquanto eu adoecia por dentro. Hoje, preservo minha saúde e meu emocional. Expresso o que sinto, vivo o que sou. Gostou? Fica. Não gostou? Vaza.
Se percebo que não sou bem vindo no lugar, eu me retiro. Se percebo que não sou querido pela pessoa, eu me afasto. Se percebo que sou ignorado em um grupo de whatsapp, eu me removo. Não preciso que me tolerem. Ficar sozinho nunca me assustou. Aliás, gosto muito. Você também deveria gostar. É tendência, nesse mundo doido.
Textro publicado originalmente em: Prof Marcel Camargo
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