Dizem que o segredo de uma mente saudável está em, constantemente, aprender algo novo ou mudar a forma como executamos velhos hábitos. Porém, acomodados na desculpa de que não temos tempo ou com medo de admitirmos que nos sentimos “velhos” para aprender, deixamos o tempo passar. Quando percebemos, fizemos 40 anos de idade e há 10 não nos propomos nada diferente. Continuamos sem falar um segundo idioma; diminuímos a lista de amigos, pois os antigos se distanciaram e não nos abrimos para a “gente estranha que se mudou para o apartamento ao lado”; o tão sonhado curso de fotografia que nunca fizemos e a viagem entre amigos que nunca sai do papel engrossam a lista dos desejos nunca realizados que, com a chegada de um novo ano, batem à nossa porta mais uma vez.
Ao terceiro dia de 2020, me vi diante de algo que soava como vontade, mas ao mesmo tempo, um desafio: viajar sozinha. Nunca havia feito e, confesso, aconteceu mais por falta de companhia. Aos 45 do segundo tempo não era possível cancelar a reserva da pousada, a passagem já estava comprada e havia só uma opção: enfrentar o medo de passear por aí sem um parceiro ou amigo.
Com uma certa má vontade (confesso), peguei a mala preta de rodinhas, vesti uma calça confortável, uma camiseta branca, calcei o velho All Star e embarquei. A chuva dos últimos dias era prenúncio de possíveis decepções, mas ao mesmo tempo, deixava a mata à beira da estrada exuberante e viva, mostrando que o melhor destino para viajar sozinha nem sempre está no Google.
E, quando menos percebi, já estava em meu retiro solitário e pacífico aos pés da serra, deitada em uma rede vermelha, com um livro a tiracolo, escutando o barulhinho da água caindo em cascata e observando o dia ir embora sem pressa. Um café na lanchonete, um sorvete ao lado de uma mesa com amigos que riam sem motivo, um litro e meio de água comprada no supermercado e uma soneca da tarde enquanto uma chuva generosa caía sobre as árvores lá fora! Puxei papo com alguns estranhos, me permiti o silêncio, observei os pequis nos pés, severos de tão verdes, os canarinhos gulosos em torno do farelo de milho e duas árvores da mesma espécie esfregando na minha cara suas copas recheadas de flores amarelas. (Seria inveja dos canarinhos?!).
Fiz longas caminhadas, senti medo por ser a mulher sozinha que anda por aí, apreciei as cachoeiras, ouvi o barulho das águas correndo para o mar, fotografei o bonito do caminho como quem deseja guardar a beleza em uma caixa e, na falta do diálogo com o outro, me calei e observei mais.
O mundo, este lugar pequeno, ainda me brindou com um encontro fortuito com uma velha amiga no meio de uma trilha ecológica e eu agradeci à vida! Mesmo solitários, levamos sempre o que somos, mas principalmente, aqueles que amamos.
A chuva generosa de janeiro não impediu a beleza do passeio, a falta de companhia não me roubou a possibilidade do encontro e o medo não impossibilitou a experiência. Ao procurar lugares seguros para viajar sozinha, descobri que não pode faltar na mala, o legítimo direito de ser o que somos.
Um brinde aos novos dias, ao novo ano e às infinitas possibilidades da vida que moram atrás das portas, cujas chaves, nós guardamos.
Abraços e obrigada,
Cris Mendonça
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