Oito horas da manhã de um dia nublado. O sinal abre para a passagem dos pedestres e, enquanto atravesso a rua, do lado oposto um pai com o filho no colo vem na direção contrária. De repente, o pequeno aponta para outro sentido, diz algo que não compreendo e sorri com gosto. Diante do entusiasmo da criança, não resisto à curiosidade e olho para onde ela destaca. Meus olhos de mulher adulta não conseguem captar: na minha frente vejo apenas uma fila de carros cinza – algum sequer colorido – parados diante do sinal vermelho. Perdida na minha “adultice” alcanço o outro lado da rua ciente, enfim, do que havia chamado a atenção do menininho: a sua própria inocência. As crianças habitam universos paralelos em que os objetos e os personagens nunca serão figuras banais.
Toda criança tem essa magia: com a sua chegada ela traz para a família um novo olhar sobre o mundo. As coisas, vítimas dos nossos olhares cansados, ganham novas nuances. Com os pequenos por perto, a joaninha sobre a folha é apontada com carinha de alegria, o ônibus torna-se uma criatura espantosa, sempre acompanhado de um olhar arregalado, e o barulhinho do plástico bolha ao estourar desperta risadas tão gostosas como sol nas manhãs de domingo.
As crianças iluminam a vida familiar! Ainda na gestação de suas mães são capazes de despertar expectativas e sonhos. Fomentam o imaginário dos avós sobre com quem irão se parecer e aguçam os tios na disputa dos melhores nomes para o bebê. Os priminhos aguardam ansiosos mais um membro para as brincadeiras e alvoroços. E quando nascem, florescem com elas, um novo jeito de viver em família. A rotina dos pais que precisam se adaptar vai, ao longo do tempo, apenas sendo como é. Há brinquedos espalhados pela casa e cada nova palavra ou passinho são celebrados como merecem ser…
Em torno da criança que chega – seja ela vinda de uma gravidez ou de uma adoção – a vida familiar caminha pela estrada do afeto. Sentimento que exige também valentia, maturidade e sabedoria, pois o amor que chega com uma nova criança é sempre transformador. Adoça os pais ranzinzas que se tornam avôs babões, ressignifica a maternidade das que se transformam avós, dá aos tios uma dose homeopática da paternidade e alegra o dia daqueles que não desejam ter filhos, mas recebem sempre com carinho uma nova vida que chega!
Uma amiga vivida sempre me diz “que toda criança é feiticeira” e não sou capaz de duvidar das palavras dela. Pelos olhos dos pequenos me reinvento, me redescubro e me proponho o convite de me adoçar diante da vida. Recebo cada criança que se aproxima em nome da menininha que um dia eu fui e, por vezes, merece ser relembrada.
Que os nossos olhos adultos continuem a ver crianças: as que colorem o mundo e as que habitam nos nossos corações!
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