A casa da minha infância tinha um imenso quintal – imenso para meus olhos de criança. Eu costumava passar tardes inteiras imersa naquela vastidão. Encarapitada no banco de pedra, com braços e coração abertos para o destino, tive certeza que meninas podiam voar.
No bate e volta da bola na tabela de basquete fui rainha do lance livre em inúmeros campeonatos individuais. Tendo lajotas vermelhas por testemunhas, eliminei as rodinhas da bicicleta, transformei o chão em céu virando múltiplas estrelinhas e, finalmente, encontrei a resposta para a pergunta mais intrigante do meu universo infantil.
Os adultos gostam de medidas. Contabilizam moeda, medem quilometragem, contam os anos, os bens e as vantagens. É natural que queiram entender o tamanho do amor. Talvez por isso, minha mãe sempre perguntava: “de que tamanho você me ama?”. Eu, tão pequena, achava difícil encontrar resposta satisfatória. Um dia, no quintal, girando braços e nuvens, descobri que eu a amava do tamanho da maior coisa que eu conhecia: o prédio verde ao lado, que continuava girando, e se agigantando, mesmo quando eu encerrava meu giro.
Não tem jeito, a gente gosta de classificar (até mesmo sentimento). Classificamos o amor das mais variadas formas, tamanho, alcance. Eu posso abrir meus braços, explicando ao meu pequeno “eu te amo deste tamanho”, e ele vai entender que o amor é bem maior que a minha envergadura. Ele pode responder “eu te amo infinito” e eu saberei que esta imensidão cabe dentro dos nossos corações.
Eu gosto de colecionar (até mesmo frases). Coleciono expressões sobre a medida do amor. Descobri que a pergunta da minha infância faz parte de uma busca universal. O amor é sempre o mesmo. O tamanho é sempre grande. A medida é pessoal, mas ecoa nos corações do mundo todo com a mesma batida.
“I love you to the moon and back”. Original de um livro para crianças, esta frase escapou do universo infantil e ganhou espaço entre gente de todos os tamanhos. Amplamente traduzida e disseminada, conquistou corações – de pais e filhos a casais enamorados. Quantos lares ganharam sua própria versão desta medida do amor? “Eu te amo até a lua, ida e volta” – que bela maneira de expressar o tamanho do amor, sentimento maior que o Universo!
Para nós praticamente impronunciável, “az hameye donya bishtar dosted daram” é a forma persa de declarar “eu te amo maior que o mundo”. O mundo é gigante em tamanho e possibilidades, o amor igualmente. Eu jamais conheceria uma frase no idioma farsi se uma amiga minha não tivesse ganhado o mundo e conhecido, no Canadá, um rapaz proveniente daquelas paragens. O amor não tem fronteiras e torna o mundo pequeno para as pessoas destinadas a se encontrar.
No idioma que me encanta, é dito, com biquinho: “Je t’aime jusqu’au bout”: “eu te amo até o fim”. O amor sem medida acompanha as curvas de uma longa estrada, atravessa o tempo, vence barreiras, padece e se deleita. Porém, haja o que houver, sempre estará lá. Até a última parada, até o último suspiro. O amor é o que fica – até o fim, e ainda depois.
Na terra dos hermanos a vida imita a arte – ou vice e versa. Crianças e adultos carinhosamente dizem “te quiero hasta el infinito y más allá”. Não posso deixar de imaginar um boneco estilo foguete levando o amor flamejante ao “infinito e além”. É o mundo de los niños conquistando o espaço – e os corações.
Percebi que o tamanho do amor está sempre relacionado ao céu e sua grandeza imensurável. É justo! Todo o resto é finito. O firmamento engloba o que os olhos não alcançam. Eu, menina de quintal, muito antes de aprender sobre as coisas do mundo, entendi o tamanho do meu amor.
“Eu te amo mil prédios, mãe! Mil prédios verdes!” O prédio que girava entre as nuvens da minha infância não era um espigão – mas era a coisa mais alta que eu conhecia. Parecia satisfatório representar meu sentimento imaginando um prédio sobre o outro até o número que tendia ao infinito: mil. Talvez o conjunto alcançasse as estrelas, indo até a lua, ida e volta. Ultrapassando o céu, era maior que o mundo. Certamente configurava um amor até o fim – ou sem fim – ao infinito e além.
Minha representação do tamanho do amor virou tradição familiar. Aparece nos desenhos e na fala das crianças de agora, resgatando (e eternizando) a menina que eu fui. Cada vez que ouço “eu te amo mil prédios” me transporto para o banco de pedra no quintal da minha infância, onde aprendi a voar – e a amar.
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Mônica Moro Harger • 25/06/2019
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