Por Hellen Reis Mourão
Muitos se perguntam qual seria a ligação de Jung com a astrologia. A verdade é que existe uma intensa ligação.
Para desenvolver o conceito de sincronicidade, Jung se debruçou no estudo do I Ching, mas conforme relata precisou da astrologia, pois esta oferecia uma forma de avaliação mais exata (Jung, 2012).
Seu interesse era tão intenso, a ponto de sua segunda filha, Gret Baumann-Jung, tornar-se a mais famosa astróloga de Zurique e professora de astrologia. No artigo escrito por ela, intitulado O Horóscopo de Jung, publicado pela revista Planeta número 35-A (dedicada ao Centenário do Nascimento de Jung) – Editora Três, São Paulo, 1975:
“Novamente vemos como ele foi fiel ao seu horóscopo. Pouco antes de sua morte, falávamos sobre horóscopos e meu pai notou: O engraçado é que essa coisa danada funciona até mesmo depois da morte. E de fato, logo após sua morte o MC em progressão fez um trígono exato com Júpiter nativo. Num momento como esse pode-se ficar famoso. Seu livro Memórias, Sonhos, Reflexões, então recém-publicado, tornou-se um best-seller.”
Em muitas cartas Jung confessa seu interesse pela Astrologia, como se pode observar em uma carta enviada a Freud em maio de 1911:
“No momento incursiono pela Astrologia, que se revela indispensável para a perfeita compreensão da mitologia. Há coisas realmente maravilhosas e estranhas nesses domínios obscuros. As plagas são infinitas, mas não se preocupe, por favor, com minhas erráticas explorações. Hei de, em meu regresso, trazer um rico despojo para o conhecimento da alma humana. Por longo tempo ainda tenho de me intoxicar de perfumes mágicos a fim de perscrutar os segredos que se ocultam nas profundezas do inconsciente.”
A linguagem é toda simbólica e mitológica, o que foi um prato cheio para Jung compreender ainda mais sobre as camadas subjetivas da psique inconsciente tanto individual quanto coletiva.
Em 12 de Junho de 1911 Jung escreve:
“Prezado Professor Freud, minhas noites são, em grande parte, tomadas pela Astrologia. Faço cálculos, com horóscopos a fim de encontrar pistas que me conduzam ao âmago da verdade psicológica. Há coisas notáveis que certamente não lhe parecerão dignas de crédito. O cálculo da posição dos astros, no caso de uma senhora, indicou um quadro caracterológico perfeitamente definido, com numerosos detalhes biográficos que, todavia, não se aplicavam a ela, mas à mãe dela, a quem as características assetavam como uma luva. E a senhora em questão, sofre de um extraordinário complexo de mãe. Atrevo-me a dizer que a Astrologia se poderá ainda descobrir um dia uma boa parcela de conhecimento que foi intuitivamente projetada nos céus. Há indícios, por exemplo, de que os signos do zodíaco são imagens caracterológicas ou, em outras palavras, símbolos libidinais que representam as qualidades da libido num determinado momento. Cordialmente, JUNG”
Para Jung, era muito clara a ligação do mapa natal com a personalidade. Ele observou que a astrologia consistia de imagens míticas poderosas e a de que forma essas imagens se relacionavam e afetavam a psique do individuo.
Para o Astrólogo André Barbault, Jung escreve:
“Existem muitos exemplos de notáveis analogias entre constelações astrológicas e eventos psicológicos ou entre o horóscopo e a disposição geral do caráter. É até mesmo possível prever até certo ponto, o efeito físico de um trânsito astrológico. Podemos esperar, com considerável certeza, que uma determinada situação psicológica bem definida seja acompanhada por uma configuração astrológica análoga. A astrologia consiste de configurações simbólicas do inconsciente coletivo, que é o assunto principal da psicologia; os planetas são deuses, símbolos dos poderes do inconsciente”
Existem correspondências, inclusive, apontando a forma como a utilizava o mapa natal em análise, especialmente com clientes com as quais tinha um entendimento difícil do processo.
Em uma carta para o Professor B V. Raman, de setembro de 1947, ele diz:
“Como sou psicólogo, estou principalmente interessado na luz particular que o horóscopo derrama sobre certas complicações existentes no caráter. Nos casos de diagnóstico psicológico difícil, eu normalmente providencio um horóscopo para poder ter um ponto de vista partindo de ângulo inteiramente diferente. E digo que muitas vezes descobri que os dados astrológicos elucidam certos pontos que eu de outro modo não teria sido capaz de entender.”
A astrologia, com suas imagens míticas, permite a personificação dos arquétipos na forma do mapa natal individual.
Conforme Von Franz (1995):
“As constelações astrológicas representam o inconsciente coletivo: são imagens dos arquétipos projetadas no céu. O horóscopo natal revela uma combinação individual e específica de elementos arquetípicos – isto é, coletivos – semelhante ao caráter coletivo de fatores biológicos hereditários; mas, no indivíduo, esses traços aparecem numa combinação individual. A combinação dos astros no horóscopo indica, em boa medida, as características do indivíduo e seu destino psíquico.”
Mais do que uma projeção de aspectos do inconsciente coletivo, o mapa natal seria a encarnação de forças arquetípicas na vida humana.
Todas as nossas experiências psíquicas, tanto subjetivas quanto objetivas, são arquetípicas. São personalizações dos arquétipos.
As 12 casas astrológicas, no mapa astral, representam as áreas da vida humana, comum a todos os seres humanos. Em cada setor de nossa vida temos nossa forma pessoal de manifestação, pois cada casa possui uma energia, ou seja, um signo. E algumas são povoadas com planetas.
Os signos estão representados por constelações zodiacais associadas a uma imagem mitológica, assim como os planetas.
Ou seja, cada área da nossa vida contém uma imagem arquetípica, sinalizando um esforço do arquétipo para alcançar a encarnação pessoal por meio da vida humana.
Conhecer nosso mapa natal é uma forma do ego se conscientizar a respeito das energias arquetípicas que estão se manifestando em cada setor da vida. Dessa forma o ego pode colaborar ativamente para a manifestação e a realização dos arquétipos em sua encarnação pessoal.
Essa consciência traz sentido à vida, pois se trata da manifestação da nossa personalidade mais profunda que o ego.
Jung cita que a alma como Anima Mundi, a Alma do mundo, é um elemento redondo, que gira. O mapa em forma de mandala, redondo representa a roda do universo que gira ao redor de um eixo.
A forma mandalica do mapa, simbolicamente representa a totalidade da vida humana.
A Cruz contida em seu interior, representa a ligação do macrocosmo com o microcosmo (linha vertical) e a linha horizontal, a matéria e o espírito. A cruz une céu e terra. Ela é o grande mediador entre o ego e o Self.
Para finalizar, a Astrologia fez parte do interesse de Carl Jung e foi de grande importância na compreensão de aspectos psicológicos na clínica. Portanto, trata-se de uma ferramenta de análise profunda, se utilizada seriamente.
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Referências bibliográficas:
FREUD, S. A correspondência completa de Sigmund Freud e Carl G. JUNG – William McGuire (organização) – Rio de Janeiro; Imago, 1993JUNG, C.G – Letters Volume I 1906- 1950. Volume II 1951 – 1961 USA; Princeton University – 1973.
JUNG, C.G. – Aion. Petrópolis, Vozes, 2012.
JUNG, C.G. – Sincronicidade; Petrópolis. Vozes, 2012.
VON FRANZ, M. L. Os sonhos e a morte – uma interpretação junguiana. São Paulo. Cultrix, 1995.
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