Os pequenos correm ao redor da casa, enquanto o vira-lata os acompanha entusiasmado! A cena se passa em 2019, mas poderia ser 1989. Trinta anos passam como trinta segundos nas famílias numerosas!

Um casal, que nunca se beijou na boca, se casa na Matriz da pequena cidade do interior, em 1949. Vão morar na roça, na casa construída pelas mãos dos parentes e amigos. A habitação de janelas de madeira, telhas coloniais e chão batido, é decorada por um baú e uma mesa pequena de braúna, itens do pouco mobiliário que compõem o novo lar.

Logo, o jovem casal têm filhos. Um, três, sete, doze. Todos nascidos naquela terra com ajuda de uma parteira. As crianças crescem em meio às plantações e pisando no curral de vacas magras. Nas horas vagas, correm ao redor da casa, descalças e vestidas com roupas de algodão. 1969.

Alheios às notícias do mundo, vivem como viveram seus antepassados há 100 anos. Secam a palha do feijão no quintal, usam carro de boi e picam a abobrinha colhida na horta para o jantar.

Qual é o tempo que marca a história de uma família? O tempo do forno a lenha, assando biscoitos e pães de queijo? O tempo das festas de casamento regadas à cachaça, carne de porco e doces caseiros? O tempo da chegada da luz elétrica e do adeus ao ferro a brasa? O tempo do nascimento dos filhos? Dos netos? Dos bisnetos? Qual é o tempo que delineia as rugas de Maria? Onde está o tempo diante dos noventa e poucos anos do Ulisses?

Esse tempo caminha como uma sombra lenta dentre nós.  Faz parte do nosso sangue! Tem os cabelos escuros, o nariz comprido e quando sorri, cerra os olhos, já pequenos. Parece conosco, enfim! Assina nosso sobrenome, traz histórias dos tropeiros, refere-se àqueles que não sabemos mais quem são! Ele está ali: sentado no nosso banco de madeira, tatuado na porta da velha dispensa, segurando o pilar da varanda, sustentando nossas crenças!

O tempo, impregnado nessa casa, ainda vê a bisavó com o pito de palha, mas se encanta com a trineta trocando o R por L. O tempo não passou, ele continua aqui! Mora, chega e parte conosco por anos a fio, costurando a nossa colcha de retalhos.

Cristiane Mendonça

Cris Mendonça é uma jornalista mineira que escreve há 14 anos na internet. Seus textos falam sobre afeto, comportamento e Literatura de uma forma gostosa, como quem ganha abraço de vó! Cris é também autora do livro de crônicas "Mineiros não dizem eu te amo".

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