— Hei, garota, me explica uma coisa? Onde foi que te perdi?

— Lembra aquele dia que fui embora? Depois de muita lágrima rolar, de muita palavra escapar, eu saí porta afora e ali, então, já era.

— Lembro disso, claro que lembro. Cada pedaço daquela despedida ainda pulsa na minha retina, sempre que fecho os olhos. Aquela tua partida é minha maior insônia. Mas eu queria saber antes disso. O que te motivou a ir embora?

— Sei lá, boy. Uma montoeira de coisa. Num dia estava tudo bem, n’outro dia eu só estava cansada de mendigar amores, Aí decidi que era dado o momento de cortas os tês e pingar os is e foi exatamente isso que fiz. Expus meu coração inteiro pra você, estendido mal embrulhado num pacote de pão e, nas entrelinhas, naquilo que não disse, estava implorando para que você pegasse meu coração e cuidasse dele como se fosse teu. Porque era. Mas você nada fez, sabe? Ficou inflado num ego maior que a cidade inteira. Então pra mim bastou. Eu peguei o coração amarrotado, botei dentro do peito e saí. Era o melhor que podia fazer. Pelo menos pareceu certo naquela hora.

— Por que naquela hora? Você se arrependeu de ter ido? Sei lá garota, acho que agora gostaria muito de te ouvir dizer que houve um arrependimento bruto de ter partido. Que você me olhasse com aquela ternura nos olhos, cheia de segundas intenções, e dissesse que está tudo bem agora, que a gente ‘tá de novo nesse mundo para somar, não para dividir…

— Vê a merda, garoto? Agora é você quem quer que eu volte, mas você nunca se deu conta de quão doloroso e difícil foi ter partido. Eu parti meu coração em mil pedaços quando engoli o amor próprio. Simplesmente não cabia eu e você no mesmo espaço, porque você é espaçoso demais. Você não sabe, mas quando fechei aquela porta e te deixei parado às minhas costas, eu escorri pelas paredes e chorei naquele corredor pequeno e vazio, com os ouvidos atentos para qualquer sinal possível de que você estava vindo atrás de mim. Os nós dos meus dedos ficaram brancos tamanha força que fazia nos dedos cruzados. Mas só houve um silêncio ensurdecedor. Você não veio atrás de mim, porque teu orgulho sempre foi maior. E aí eu fui embora querendo ficar, porque simplesmente não havia espaço para nós dois e torci para que você chegasse para o lado, dizendo que cabia nós dois e ainda me dói um bom bocado pensar que você não moveu uma vírgula pela gente. E foi aí, exatamente aí, que você me perdeu.

— Mas e agora? Estou aqui, querendo entender como foi que te perdi e querendo arrumar a bagunça toda. Confesso que te odiei por muito tempo, porque você não tinha o direito de ir embora, porque você não deveria ter saído daquela forma, mas com o tempo entendi que você foi porque te perdi e fiquei te procurando um tempão para tentar conversar e resolver o que nem deveria ter estragado..

— Shiu, não diz nada não, boy. Agora eu que inflei demais. E mesmo você implorando, não tem espaço pra você aqui dentro.

Mafê Probst

Engenheira, blogueira, escritora e romântica incorrigível. É geminiana, exagerada e curiosa. Sonha abraçar o mundo e se espalhar por aí. Nascida e crescida no litoral catarinense, não nega a paixão pela praia, pelo sol e frutos do mar.

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Mafê Probst

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