Tem horas que o melhor que a gente pode fazer é cuidar de si mesmo, por vezes se afastar, e sair de perto das enxurradas de choros e raivas.
Ah, se adiantasse viver a dor do outro…
Se adiantasse gastar tanta da nossa energia vital para entender, para sentir, para tentar acalentar outro coração. Ah, se adiantasse a gente se transportar para outra pele e tentar fazer mudanças naquela alma e, por vezes até, entregar a própria vida tentando salvar outra…
Acho que existe uma linha tênue entre ser empático, amigo, afetuoso…. e se deixar confundir com o que dói na outra pessoa, a ponto até de, sem perceber, virarmos a razão, a causa daquela angústia.
Sim, porque se a gente chega muito perto de alguém se afogando e estamos desprevenidos, a gente se afoga junto. Ou a gente vira o motivo do que puxa pra baixo.
É que por mais que a gente ame e queira o bem, por mais que a gente ame e queira retirar os pesos, as dificuldades, os sofrimentos… a gente nunca pode vestir os sapatos alheios, assumir outro corpo, carregar no colo uma outra história de vida.
A gente pode sim dar a mão, ouvir, estar por perto… até o ponto em que ajudamos, mas ainda estamos fortes e íntegros; até o ponto em que ouvimos, mas ainda não somos atingidos diretamente; até o ponto em que compreendemos, mas não deixamos de cuidar de nós mesmos e da nossa própria vida.
Até o ponto em que não deixamos de seguir o nosso próprio caminho para adentrar a missão de salvar outra existência.
Cada um tem o seu próprio roteiro, o seu aprendizado particular. Eu penso que a gente pode sim tentar melhorar o olhar do outro, se o nosso já aprendeu a ser mais leve. Mas eu acho que isso se dá mais pela postura com que conduzimos a nossa própria vida, com a forma de sentir que escolhemos pra gente. Acho que a gente pode mais inspirar do que ensinar com palavras e preocupações. Acho que a gente pode perceber que vibrar numa energia melhor no mundo é a melhor ajuda que podemos dar.
Demorou para eu perceber, mas parece que compaixão demais pela dor alheia não ajuda a amenizar o sofrimento, pelo contrário, só o aumenta.
Talvez porque sentir junto agregue pensamentos e forças àquele martírio e o torne mais real e duradouro. Talvez porque sofrendo juntos a gente emane essas vibrações para o universo.
Pode ser que a gente pense que se carregarmos em dois aqueles momentos difíceis, vai ser mais fácil, vamos dividir os pesos. Mas nem sempre é assim! Às vezes, ao fazer isso estamos interferindo num processo que não é nosso e que era importante que existisse dentro do outro.
Afinal, uma dor sempre traz um aprendizado mais profundo.
Não é fácil perceber isso e agir assim, mas tem horas que o melhor que a gente pode fazer é cuidar de si mesmo, por vezes se afastar, e sair de perto das enxurradas de choros e raivas.
Às vezes, o melhor que podemos fazer é serenar o nosso próprio coração, deixar de se preocupar tanto com outros universos e ir cuidar dos canteiros do nosso quintal.
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