Mal posso esperar para buscar meu afilhado na escola, ponto alto do meu dia. No amplo corredor de entrada um trabalho escolar chama a minha atenção. Aos meus olhos era uma obra de arte sobre este sentimento complexo que as crianças sabem desde sempre o significado. Nas letras da palavra A M O R, enfeitadas pelos alunos, foram pendurados corações que expressam o que as crianças pensam sobre isso. “Amor é brincar”, “amor é comida”, “amor é ter felicidade”. De coração em coração, entre desenhos e palavras, fui desbravando vários amores. Até que meu pequeno amor despontou na porta da sala e, correndo para meus braços, preencheu de amor e graça meu coração e minha vida.
Para mim, amor é memória. Não somente, mas essencialmente. Ao levar meu menino pela mão, deixando que ele se equilibre nas muretas, resgato o caminho da pré-escola até a casa da minha infância, quando, amparada pelas mãos do meu pai, eu saltitava nos muros baixos daquela época. Conto para meu pequeno companheiro as brincadeiras do “meu tempo” e tento explicar que a vida é um emaranhado de lembranças, que o passeio de hoje é a memória de amanhã (e que memória boa ele tem). Assim vamos construindo, meu afilhado e eu, nossa própria história. Como um dia fizeram comigo, hoje eu faço com ele. Vamos colecionando coisas nossas, que, mesmo inspiradas pelas coisas de antes, são agora coisas novas. É a nossa vida, a nossa história, se contornando de amor e memória, uma coisa sempre ao lado da outra.
Envolvida por antigas lembranças (e empenhada construindo novas), percebo porque o “trabalho sobre o amor” tanto me sensibilizou. Frente e verso, as letras penduradas, balançando ao vento, formavam duas palavras. As duas palavras do início de tudo (do meu tudo). Relembro meu pai contando a velha história, enfatizando o anagrama, sorrindo ao final. Garantindo que quando viu a moça entrar no restaurante sabia que iria casar com ela. Descrevendo o prato do cardápio que ele achou por bem sugerir às duas amigas da mesa ao lado. Relatando a conversa boa que se desenvolveu em seguida, e o convite para conhecerem a cidade. Falando sobre o passeio e as rosas amarelas naquele sete de setembro que tudo modificou. Contando sobre as cartas trocadas entre setembro e maio. Eu sabia o fim desta história, afinal era o começo da minha. Ele sabia a parte que fazia brilharem meus olhos, era a conclusão perfeita. Ele ria brincando com as palavras, eu ia aprendendo a colecionar as memórias. Agora, tantos anos depois, ao buscar meu menino na escola, reencontro este momento. Sorrindo, como sempre, vejo meu pai contar:
“Nos conhecemos no Restaurante Roma, em Brasília. Não poderia ter sido diferente. Você não acha que era um presságio? R O M A – A M O R ao contrário.”
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