No fundo, no fundo a gente morre de medo de não caber nas expectativas do outro, sobretudo quando esse outro parece caber justinho nos nossos mais inconfessáveis sonhos.
Todos nós sonhamos com uma história bonita de vida amorosa, com silêncios confortáveis, com o encanto de sorrir à toa apenas diante da lembrança daquele sorriso.
É o sorriso que limpa a alma da gente da poeira da solidão e varre para longe os receios e manda para o espaço a vergonha de parecer ridículo.
O amor é ridículo. E, exatamente por isso, pode tudo. Absolutamente tudo. Pode ter música brega de tema, pode ter cenários inusitados, pode ter segredos compartilhados.
O segredo do amor que dura é aprender a ver na imperfeição do outro uma licença poética de revelar sem medo as nossas próprias imperfeições; é se permitir revelar os lados escuros e escusos, ainda que seja aos poucos, devagarinho, só para garantir que o outro não corra de nós, não se assuste, não nos rejeite justamente por nos termos arriscado a revelar nosso lado mais inteiro e verdadeiro.
E como é difícil aceitar que a nossa parte inteira é uma colagem atemporal de bonitezas e feiuras que vão formando um desenho surpresa de nós mesmos.
É isso que somos. Uma soma de caquinhos desiguais formando nosso mosaico de vida. Somos pedacinhos da mais rica e preciosa porcelana, mas também somos o vidro barato daquele copinho que serve tragos e cafezinhos em qualquer esquina.
Somos o pó que se acumula na sola dos nossos pés, testemunhando o nosso vasto caminho pelos cantos, curvas e paisagens deste vasto mundo.
E, de repente, nos damos conta de que esse rastro de dois pés quer demais acreditar que é possível acrescentar duas pegadas a este solitário caminhar.
E com a alma desarmada e sem travas haveremos de abrir os braços a quem se dispuser a nos olhar de perto e a nos receber, apesar de nossas inúmeras falhas, tropeços e espinhos.
Haveremos de ter coragem para dizer “Vem, que a minha imperfeição estava justamente esperando pela sua”.
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