Nós estamos juntos. Em última instância, estamos todos unidos em um mesmo tempo. Por mais que aqui e ali um grupo e outro se isolem, ainda que a uns tudo sobre e a outros nada falte, apesar da sanha cega de tanta gente por concentrar renda e latifundiar razão, pertencemos à mesma época. Os que tudo possuem e os que nada têm.
De alguma sorte, estamos atados um ao outro e não há o que fazer a respeito. Enfrentemos juntos o caminho, escalemos em grupo essa subida vertical ou o fim será um só: a corda invisível amarrada à cintura do último da fila vai nos derrubar a todos rumo ao abismo.
Uma hora ou outra, você e eu nos enterraremos nas mesmas trincheiras que cavamos entre nós. Direita e esquerda, ricos e pobres, brancos, pretos e amarelos, mulheres e homens, héteros e homossexuais, protestantes e cristãos, crentes e ateus. Estamos todos juntos. O mal que acometer cada um de nós há de espirrar em todo o resto.
Não há para onde fugir. Só nos resta nos ajudarmos um ao outro. Cabe a cada um de nós descobrir o que fazer. E há tanto, tanto o que fazer por aí!
Chega de briga. Quanto tempo jogado fora! Apesar de nossas discordâncias, somos uma mesma substância. Estamos debaixo do mesmo céu! O chão que nos sustenta sempre foi o mesmo. Você e eu e todo mundo caminhamos sobre ele e sobre ele haveremos de desaparecer um dia.
Até que esse dia chegue, tenhamos a decência de seguir com firmeza, correção e elegância, pelo Amor de Deus! Seja lá por onde formos, não pisemos em ninguém e desviemos em tempo dos pés malvados que encontrarmos no caminho.
E que o vento nos ajude a seguir em frente, um sopro fresco e forte que arranque as roupas do varal, bagunce os cabelos da gente e desarrume tudo quanto for armado e vil. Que esse vento baderneiro atrapalhe os planos dos canalhas, leve embora o que é ruim e traga de longe o perfume de velhas saudades, renovando nossa esperança e limpando nossos caminhos com a força de um milhão de anjos soprando vida longa, amor e festa sobre nós, prontos para seguirmos livres sobre um infinito gramado verde onde pisaremos sem culpa, cada um em seu rumo, juntos num mesmo tempo que amanhã há de ser melhor, muito melhor do que hoje.
Imagem de capa: gpointstudio, Shutterstock
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Proibido pisar nos outros, nos animais (incluindo as formigas), e na grama também não se deve, afinal ela vai ficar sem o viço e a beleza que a gente aprecia ver. Proibido torcer o pescoço das galinhas antes de as cozinharmos na panela. Proibido prender passarinhos em gaiola, porque eles foram concebidos para espaços infinitos, maiores que três ou quatro palmos e se engana quem pensa que eles cantam: eles choram. Estamos juntos, é verdade, mas nem sempre pensamos igual, então o bicho pega. É possível estar perto de alguém que está longe de nós, em outro espaço e em outro tempo, tanto quanto se pode estar perto e até ouvir a voz de alguém que está do outro lado do oceano, vivendo a vida que gostamos de viver e sonhando o mesmo sonho. Proibido pisar nos outros, a não ser que estejam maltratando os mais fracos, aí, sim, é permitido tentar impedir, porque se a gente não impede que se pratiquem as injustiças contra os injustiçados, a gente é cúmplice.