A sala permaneceu calma por uns longos vinte minutos. As cortinas pareciam ter acordado mais cedo que o habitual. As flores do jardim balançavam-se num ritmo perfeito enquanto meus olhos fotografavam todo aquele ambiente sublime. Meu sorriso fez amor com as pinturas nas paredes da sala, as gavetas pareciam respirar ar puro quando abertas por mãos macias. A luz alaranjada que invadia as janelas, cobria todo o hall com tons alegres de vida.
Eu contemplava tudo em que meus olhos pudessem tocar. O tapete marrom empoeirado, as estantes cobertas de histórias bonitas, as meias jogadas que fizeram parte destas histórias, as manchas no sofá antiquado, até as roupas íntimas que juntas intimamente faziam amor com o chão gelado. Eu admirava a xícara com a marca de um batom com um intenso vermelho grená, migalhas de pão ao redor da mesa molhada de leite quente, as madeiras gastas das cadeiras da cozinha.
Nada passava despercebido por minhas retinas escuras.
Nem as fotos antigas.
Nem os discos do Chico.
Ou muito menos o cheiro de mirra.
Era mágico contemplar tudo aquilo, não era loucura, apenas um jeito diferente de ver o mundo.
– Sério, Fernando. Você não achou a Lúcia maior gata?
– O quê? Que Lúcia?
– Ohh! Acorda, cara. A garota que lhe apresentei faz pouco tempo.
– Sério que você não viu nada?
– Pelo contrário, eu vi tudo.
– Então; vai sair com ela?
– Não, mas acho que vou alugar este apartamento.
Imagem de capa: Africa Studio, Shutterstock
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