Não houve tempo para despedir. E pra ser sincera eu acho que nem houve tempo direito pra te sentir. Não da forma como eu gostaria. Uma vida com você teria sido pouco. Uma era e uma galáxia também não teriam proporcionado tempo e espaço suficientes. Tudo isso era aquém do que eu pretendia. Era preciso muito mais para eu considerar razoável.
Você certamente foi o homem mais quebrado que eu conheci. Quebrado porque eram muitas peças, como um quebra-cabeça quase impossível de ser montado. E eu, também muito quebrada, me apaixonei por cada pedaço seu. Mas sabemos que misturar as peças de dois quebra-cabeças tão complexos, dificilmente daria certo. Como separá-las depois do depois? Impossível se eu nem mais me lembrava de como era o antes.
Cada dor que você aparentava sentir, cada dúvida, cada pensamento, cada insatisfação com a vida, cada questionamento… todos os seus cacos ultrapassaram a superfície da minha epiderme e ocuparam um lugar muito mais profundo, que nem mesmo eu sabia que existia. A minha dificuldade seria retirar cada um dos seus cacos quando agora eu suspeitava que eles já eram parte de mim. Até hoje, mesmo depois de tanto tempo, eles estão aqui.
Eu te disse tanto, mais do que disse a qualquer um. Simplesmente porque eu senti mais do que eu senti por qualquer outro. Ainda assim, muito ficou por dizer. E essas palavras me rondam incessantemente como feras em torno de uma presa já vencida. Eu sei que não vou ter paz, mas dizê-las já não faria mais sentido quando elas se referem a um passado cada vez mais distante.
Para então não pronunciar o que não deve ser pronunciado, eu toco em teclas que formam palavras que se aproximam vagamente do que eu deveria ter dito tempos atrás, quando por um acaso qualquer as nossas órbitas se tocaram, modificando a atmosfera de tudo aquilo que eu respiro. Noites, semanas e meses se passaram e eu tento aceitar o fato de que o ar que respirei junto a você um dia eu não vou respirar de novo.
Imagem de capa: bondart, Shutterstock
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