Igor Cruz

Às vezes precisamos deixar

Porque é tão difícil aceitar o fim? Como podemos sair num dia qualquer e virar as costas, partir sem olhar pra trás, sem pensar no que deixou de lado. Apagar um passado que ainda é tão presente. Aceitar que nossos caminhos já não são mais os mesmos e que nossas vidas estão indo em sentidos diferentes. Da mesma forma que não consigo me lembrar da minha vida antes de você, agora tem sido cada vez mais difícil pensar no meu futuro sem você.

Um futuro que nós escrevemos juntos e desenhamos naquela árvore, naquela ruazinha que você sabe bem, naquele dia que só você sabe qual, quando deitamos na grama e contamos tantos causos que jamais imaginaria dividir com ninguém. Como é difícil esquecer esses momentos que me fazem ser quem eu sou hoje e por mais que eu tente tem sido estranho imaginar esse futuro sem você.

Passo semanalmente próximo ao lugar onde fizemos a maior parte desses planos, não porque eu goste de me martirizar lembrando de você, mas porque é o caminho mais perto e também é um dos lugares que mais gosto. Não posso aprender a desgostar de tudo aquilo logo agora que não tenho você para me influenciar a olhar as belezas das árvores e o cheiro da água correndo abaixo dos nossos pés, muitas coisas que na verdade só aprendi a gostar por sua causa. A cada vez que passo por lá meu coração se estremece todo e me falta o ar só de lembrar tudo o que sonhamos ali. As ruas ao redor ainda estão do mesmo jeito, nenhuma casa foi reformada, não plantaram nenhuma árvore nova, o nosso lugar na grama ainda está como vimos na última vez, com as mesmas falhas e os mesmos caminhos em que passávamos para chegar até a borda, e de uma maneira incrivelmente triste tudo está exatamente como estava. A única diferença é que você não está mais aqui para conversar comigo. Para jogarmos pedras na água, para fotografarmos passarinhos e outros animais que uma vez ou outro aparecem por aqui.

É estranho como pequenos fragmentos de terra podem nos levar a memórias tão lindas e tão perfeitas. Memórias estas que nem eu mesmo sabia que existia. Esse era o nosso lugar. Mesmo que tenhamos passado por tantos outros durante esse tempo, esse ainda é o melhor. As melhores fotos, as melhores lembranças, os maiores sonhos, os piores medos, o encontro, a despedida. Tudo está presente em tão poucos metros de grama e algumas árvores que dão pouca sombra, mas nos sujavam horrores.

Tudo ainda está lá, onde deveria estar. Todos nossos sonhos ainda estão imersos naqueles galhos, naquelas flores, nossos maiores segredos estão marcados naquele chão, e até mesmo eu estou lá, sempre no mesmo lugar. Mas não te encontro mais, meus olhos já não cruzam mais com os seus, imagino te ver chegar pelo mesmo lugar que fazia antes, te imagino aqui a cada minuto, mas no fundo sei que isso não vai mais acontecer. Faz muito tempo que você se foi, é verdade, mas aqui dentro de mim ainda resta muito de você, pois não consigo recuperar quem eu era antes de você, não consigo me lembrar dos sonhos que eu fazia antes de você surgir.

Seria muito mais fácil se você não tivesse tido importância pra mim. Que você não fizesse parte de tudo que eu construí nesses anos todos. Seria muito mais fácil seguir em frente se ainda não estivesse tão ligado a você. O problema é que não aprendemos em lugar algum na vida a dizer adeus, ninguém nos explica como superar toda essa falta que uma pessoa possa fazer em nossas vidas. Sinto falta de você aqui, sei que pode parecer loucura, mas preciso que devolva o que levou de mim quando partiu assim tão repentinamente.

E hoje a única coisa que ainda me restam são fotos suas, fotos dos nossos momentos que permanecem vivas e me trazendo de volta aos mesmos pensamentos que eu tinha antes e que na memória que sempre ficarão guardados. Momentos estes que continuarei cultivando até que a vida tome seu rumo. Momentos que me fazem agradecer a cada dia esta sua passagem um tanto quanto curta, mais verdadeira em minha vida. Momentos que estão escritos em todos os cantinhos daquele nosso pedacinho de grama, daquele nosso riozinho e aquela nossa árvore. Momentos que me fazem agradecer a cada dia o fato de você ter estado aqui. Mas hoje ainda preciso aprender a esquecer de tudo isso e aceitar que toda história tem um início e um final.

Imagem de capa: Alejandro J. de Parga, Shutterstock

Igor Cruz

Arquiteto, urbanista, escritor, podcaster e editor. Escrevo em busca de algo que me conecta com o outro, que me faz emergir em uma onda de amor e pensamentos sobre o que a vida ainda pode ser. A escrita é uma ponte que nos conecta há um novo mundo cheio oportunidades e conhecimentos. Cabe a nós e somente nós, dar o primeiro passo para atravessar essa ponte. Podcaster no InFormais Podcast.

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