Gustl Rosenkranz

A vaidade é uma ilusão que limita, aprisiona, rouba tempo, dinheiro e oportunidades

A vaidade em si não é algo ruim

A vaidade em si não é algo ruim. Ela faz com que cuidemos de nós mesmos, que tenhamos vergonha de andar sujos, rasgados, maltrapilhos.

Um pouco de vaidade faz bem. Na dosagem certa, ela nos leva, por exemplo, a praticar esportes para ter um corpo bem desenhado ou a nos vestirmos de uma forma que permita que nos sintamos bem dentro da roupa que usamos. Ela faz com que tenhamos um cuidado saudável com imagem de nós mesmos que passamos aos outros.

O problema começa com os exageros

A vaidade começa a ser um problema quando se exagera.

Ela é um problema quando ganha um papel demasiadamente importante em nossas vidas e quando começamos a nos preocupar mais com a aparência do que com a essência.

Uma pessoa extremamente vaidosa termina limitando a própria liberdade, já que se entrega a uma ilusão, a padrões, à moda, a marcas e àquilo que ela acredita que será “bem visto” e admirado pelos demais, mas que não tem essência real.

Uma pessoa muito vaidosa é prisioneira de sua vaidade. Ela perde muito tempo cuidando da própria imagem. Termina gastando muito com roupas, cosméticos, cabelereiro, jóias, bugigangas e apetrechos. A vaidade nos rouba assim tempo e dinheiro.

A vaidade não se limita ao físico!

Mas ser vaidoso não significa somente cuidar da aparência física. Uma pessoa vaidosa quer ser admirada em todos os sentidos.

Ela busca ser bem vista também no que fala ou escreve e em sua opinião. Tem uma sede enorme de que se confirme sempre que tudo que vem dela é digno de admiração.

Como essa necessidade de admiração (que tem por trás uma outra necessidade: a de autoafirmação) quer ser saciada, o vaidoso termina se limitando também no que diz respeito à tolerância e à aceitação de opiniões diferentes, já que quem não concorda com ele não o admira e isso não pode ser aceito de forma alguma.

Tudo está bem para o vaidoso enquanto houver uma “plateia” aplaudindo…

Enquanto a pessoa vaidosa for elogiada e enquanto houver uma plateia aplaudindo sua aparência, seus atos, suas palavras e toda e qualquer coisa que venha dela, tudo estará bem. Pois é isso que ela quer e até acredita que precisa.

Mas o que acontece quando essa pessoa e aquilo que ela faz ou apresenta de si é rejeitado? Quando ela é questionada ou simplesmente ignorada? A pessoa, que é prisioneira de sua vaidade, não gosta nada disso, se aborrece, se decepciona ou mesmo fica agressivo ou entra numa espécie de depressão.

Só não se pode esperar que essa pessoa reconheça sua dependência da vaidade e do absurdo de seu comportamento, já que exatamente essa vaidade o impede de enxergar isso. Se uma pessoa se sente maravilhosa, por que ela deveria mudar?

O vaidoso nunca vê erros em si mesmo (já que é maravilhoso e digno de admiração). Ele busca sempre o erro nos outros: se alguém não o admira, é essa pessoa que tem um problema e não ele!

A internet é o “playground“ dos vaidosos

Antigamente, pessoas extremamente vaidosas sonhavam em aparecer na TV, ter uma foto ou um texto seu publicado num jornal ou revista ou de subir em um palco para se apresentar ao público. Isso não era coisa fácil e somente poucos conseguiam.

Hoje em dia, nada disso é mais necessário, já que os vaidosos têm a internet. Lá eles mesmos podem se colocar em cena. O YouTube está aí como excelente exemplo de ninho de vaidosos. Do Facebook eu nem falo.

Ou seja, hoje em dia, qualquer um pode se colocar em cena em um palco virtual e alimentar sua vaidade sem muitos esforços.

A culpa não é da internet

Não faz qualquer sentido demonizar a internet. Ela não tem culpa de nada. É simplesmente um meio de comunicação, como o rádio, a TV, jornais e revistas. E é um meio muito útil, com muitos lados positivos.

A internet tem dado chances a pessoas realmente talentosas. Esses talentos talvez nunca fossem descobertos se fossem depender de outros meios de comunicação. E isso é bom, muito bom.

Uma pessoa talentosa e sem muitos recursos pode assim apresentar seu trabalho, graças à facilidade de publicação que a net oferece.

Entretanto, é essa mesma facilidade de publicação que fomenta o surgimento de pseudotalentos. Essa gente vaidosa que só quer aparecer (muitas vezes fazendo os maiores absurdos para isso!). Aí vemos gente sem graça se sentindo “o rei da cocada preta“ por ter postado alguma coisa numa rede social e ter conseguido receber alguns likes ou compartilhamentos.

Blogueiros distribuindo autógrafos e sinais de perda de qualquer senso de realidade

Recordo-me bem de uma blogueira, que, em minha opinião, apresentava conteúdos bem fracos. O blog já existia há muitos anos e sua fanpage no Facebook tinha pouco mais de mil curtidas, o que não é muito.

Enquanto conheço gente talentosa, com milhões de seguidores, mas que não se deixam contaminar pela vaidade e continuam com os pés no chão, fiquei pasmo ao ver essa blogueira publicando um vídeo no Facebook, no qual ela convidava seus fãs para um encontro, no qual ela distribuiria autógrafos.

Basta olhar um pouco as publicações em redes sociais para perceber que não se trata de um caso isolado. São muitos os que terminam perdendo qualquer senso de realidade em prol de uma vaidade que não os leva a lugar algum.

Aparecer a qualquer preço

Como a vaidade quer ser saciada e a confirmação pelo público de a pessoa em questão é maravilhosa, ela não mede esforços para aparecer e chamar a atenção.

Chega a ser cômico ver gente vaidosa então filmando ou fotografando até sua própria casa, seu quarto de dormir, sua esfera mais privada para mostrar na internet.

Há cenas que chegam a ser ridícula, como uma mulher que fez um selfie de si dentro do quarto e nem percebeu (ou percebeu, mas não ligou para isso) que o marido/noivo/namorado estava deitado na cama, dormindo de boca aberta, com uma barriga enorme de fora e uma garrafa de cerveja na mesa de cabeceira.

Outro fenômeno que ilustra bem a perda de senso de realidade do vaidoso são os cantores desafinados que vemos por aí, cantando de uma forma horrível em algum vídeo na net, mas se achando um verdadeiro Roberto Carlos ou Caetano Veloso da vida.

A vaidade é tanta que ofusca a vista para muitas oportunidades

Pessoas vaidosas em excesso ficam tão preocupadas consigo mesmas que terminam não enxergando outras pessoas. Elas não dão uma chance real ao outro de também se apresentar e entrar em cena. Isso termina fazendo com que quem é vaidoso deixe de fazer contatos interessantes, que possam lhe trazer novas oportunidades.

Um vaidoso não enxerga realmente o outro. Ele não o vê como alguém com os mesmos direitos de aparecer. Para ele, o outro é plateia, que deve aplaudir sempre que ele (o vaidoso) se mostra em público com toda sua vaidade.

Às vezes, o vaidoso conhece alguém que até se interessa pelo que ele faz, mas que termina se assustando e se afastando ao reconhecer que tudo não passa de projeção do ego. Qualquer pessoa inteligente termina pulando fora ao entender que tudo que o vaidoso faz não passa de um esforço unicamente voltado à autoafirmação.

O que está por trás da vaidade…

O que leva alguém a ser tão vaidoso e a se comportar de tal maneira?

Para mim, quem tem tamanha necessidade de se autoafirmar constantemente sofre obrigatoriamente de autoestima muito baixa e complexo de inferioridade. Uma pessoa com boa autoestima não precisa disso.

Muitas vezes, a vaidade serve para disfarçar uma grande carência afetiva não assumida.

O vaidoso prefere se preocupar com seu exterior (aparência, como as pessoas o veem, como o público reage à sua pessoa, etc.), muitas vezes por medo de ver a “feiura” que carrega dentro de si. Medo de ver as sombras que o acompanham. Medo de reconhecer sua existência medíocre e sem graça.

No fundo, a vaidade é uma máscara para disfarçar a essência que falta.

E o vaidoso pode também sofrer de algum transtorno mais sério. Vaidade e narcisismo, por exemplo, andam muitas vezes de mãos dadas.

Tenha cuidado, pois o excesso de vaidade pode afetar a todos nós

Como disse no início deste texto, a vaidade em si não é má. É a dose que faz o veneno.

Quando exageramos e nos ocupamos demais com nós mesmos, perdemos tempo, gastamos dinheiro e nos limitamos.

No final das contas, nos concentramos tanto no que queremos ser para os outros que terminamos desaprendendo o que realmente somos.

Não se preocupe com sua vaidade se ela não domina sua vida. Não se preocupe com ela se você ainda vê os outros e não só a si mesmo. Está tudo bem se seu senso de realidade ainda estiver saudável. Nesse contexto, seja vaidoso tranquilamente, cuide de você, de sua aparência e procure se sentir bem em sua pele.

Mas tenha cuidado com exageros, pois eles podem afetar facilmente a todos nós.

Imagem de capa: wavebreakmedia, Shutterstock

Gustl Rosenkranz

Blogueiro brasileiro residente em Berlim.

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