Fazia tempo, muito tempo, que eu não mastigava a raiva como quem mastiga um chiclete ruim. A descarga de adrenalina percorreu meu corpo inteiro, as pernas começaram a tremer e as mandíbulas se travaram, pressionando os dentes com força desmedida – algo que me rendeu uma dor de cabeça ao acordar.

A raiva durou pouco mais de dois minutos e trinta e sete segundos. O sal queimou nos olhos, deixei escorrer uma lágrima ridícula e continuei massacrando meus dentes. Senti ódio da raiva que pulsava. Senti ódio por chorar. Senti ódio por ir dormir bagunçada, agitada e com a mandíbula travada (bruxismo, saca?). Eu não queria esses sentimentos dentro de mim, sabe? Eu achava que merecia mais – ainda mais em tempos tão difíceis.

Respirei fundo incontáveis vezes na tentativa de diminuir o batimento cardíaco. Sequei as lágrimas do rosto e, felizmente, elas pararam de cair. Fingi um sorriso para a câmera. Vi uma live divertida e me ajeitei para dormir. Rangi dente a noite toda, e tudo bem, já previa. Não sonhei – um bônus que não esperava.

Na boa? Eu cansei.

Cansei dessa gente que não pensa antes de falar. Cansei dessa gente que, depois que o estrago tá feito, vem com mentiras, vem com riso debochado. Gente que não assume o que faz, tá ligado? Tentando colocar panos quentes numa treta que começou, o que me dá mais raiva ainda, porque não me faz de idiota, caramba!

Eu tô cansada.

Cansada de ter que pisar em ovos, cansada de tudo ser sempre tão difícil, cansada de ter que cuidar com as palavras, com a forma de dizer, com ter que me justificar sempre, de ter que explicar sempre, de ter que me diminuir sempre.

Cansei.

Cansei de não ser mais eu mesma onde antes eu era a melhor versão de mim. Cansei de não reconhecer as pessoas onde antes via um refúgio. Cansei de ver tempestade onde era calmaria. Cansei de ver guerra no meu cantinho de paz.

Cansei.

E agora aqui, cansada e desabafando, o sal volta a queimar meus olhos e eu fico engolindo o choro que não quero chorar, porque eu cansei de derramar lágrimas (e vieram vários ‘por quem’ aqui, mas apaguei para evitar a fadiga – ó eu, outra vez, pisando em ovos. Ó eu, outra vez, me anulando. Ó eu, outra vez, calando. Ó eu, outra vez, deixando de fazer o que quero/gosto/tenho vontade…).

Eu cansei.

E dói.

E sufoca.

E me anula.

E me enche de interrogações, porque quero entender como pode tudo mudar (Brown, Charlie.), como pode pessoas, tão próximas e sinceras e intensas, se tornarem desconhecidas. Como pode ter tanta farpa onde antes havia tanto amor.

Na boa? Cansei.
(de escrever esse texto também).

Imagem de capa: maradon 333, Shutterstock

Mafê Probst

Engenheira, blogueira, escritora e romântica incorrigível. É geminiana, exagerada e curiosa. Sonha abraçar o mundo e se espalhar por aí. Nascida e crescida no litoral catarinense, não nega a paixão pela praia, pelo sol e frutos do mar.

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