Marcel Camargo

Nem todos os finais são felizes, mas todos deveriam ser dignos

Imagem de capa: FWStudio, Shutterstock

Por tudo o que lutamos para que o final não chegasse, merecíamos um final digno, para que as nuvens se dissipassem mais cedo, vislumbrando-nos todo o caminhar que há pela frente.

Não existe adeus tranquilo, não existe separação leve, nem despedida serena, uma vez que o rompimento com o que já parecia ser nosso abala as nossas certezas. E esse abalo traz decepção, saudade, sofrimento e desesperança, pelo menos de início. Mesmo que, lá na frente, confirmemos que era o melhor a ter ocorrido, ali no meio do turbilhão de sentimentos, a sensação de perda é primazia.

Não muitos encaram o processo de mudança de frente, seja para romper com pessoas, com lugares, seja para deixar ideias para trás. As pessoas ouvem e assimilam o que lhes chega, guardando aquilo tudo dentro de si, de acordo com o que possuem intimamente e na sintonia daquilo em que elas próprias querem acreditar. Porque só somos convencidos daquilo em que acreditamos – há raras exceções nesse sentido. Poucos têm disposição de mudar a direção de suas crenças, pois isso dói muito e requer uma coragem absurda. O mesmo ocorre em relação a pessoas.

Não estamos preparados para enfrentar o que não dá certo, o que termina de vez, porque parece que sempre sonhamos com o sucesso, embalando-o, envolto com todas as nossas forças, esquecendo-nos de guardar um lugar onde repousar nossas derrotas, as rejeições, os nãos, as despedidas enfim. E então, quando a vida não dá certo, a gente se revolta, a gente sofre demais, porque a gente não se preparou para isso, por nem um minuto sequer. Queremos mesmo é o “felizes para sempre”.

Infelizmente, o “para sempre” pode não durar a vida toda, as pessoas não ficam o tempo todo junto de nós, as oportunidades podem não aparecer do jeito que queríamos, o amor pode não voltar na mesma medida, tampouco vir de quem tanto desejamos. Talvez os finais, por isso mesmo, sejam tão importantes – ou até mais – do que os inícios. Quanto mais traumático e doloroso for o adeus, mais difíceis serão para nós o reerguimento e a esperança no poder de cada novo dia.

Embora seja difícil, é preciso muita força e muita maturidade para atravessar os rompimentos da vida, sem que tentemos manter um mínimo equilíbrio, necessário para que não nos percamos de nós mesmos nessa dor. Pessoas que vivenciaram sentimentos e afetos juntos, pelo tempo que for, no mínimo deveriam se despedir sem gritaria destemperada e ofensas generalizadas, ainda mais se houver filhos em jogo.

Por tudo o que lutamos para que o final não chegasse, merecíamos um final digno, para que as nuvens se dissipassem mais cedo, vislumbrando-nos todo o caminhar que há pela frente. Quase nunca é assim, mas deveria sê-lo.

Marcel Camargo

"Escrever é como compartilhar olhares, tão vital quanto respirar".

Share
Published by
Marcel Camargo

Recent Posts

Prepare o sofá e o coração: a comédia romântica da Netflix que é perfeita para um dia em casa

Se você está em busca de um filme leve, divertido e emocionante para curtir em…

12 horas ago

A direção para qual você olha quando está pensando revela algo sobre sua personalidade

Já reparou para onde seus olhos vão quando você está pensando profundamente? Desviar o olhar…

13 horas ago

Esse filme foi indicado a 300 prêmios e vencedor de 6 Oscars e você provavelmente ainda não viu

Aclamado por sua grandiosidade visual e narrativa, o épico “Duna”, dirigido por Denis Villeneuve, já…

2 dias ago

“Não tenho a menor vontade de ser pai”, diz Fabio Porchat sobre decisão polêmica

O humorista e apresentador Fabio Porchat, 41, revelou que decidiu não ter filhos e descreveu…

2 dias ago

Tipos de caracteres invisíveis e seu uso no processador de texto

Caracteres invisíveis são caracteres Unicode especiais que parecem invisíveis aos olhos humanos, mas desempenham um…

2 dias ago

Saiba quais são as 3 frases mais usadas por pessoas egoístas

O egoísmo, presente em maior ou menor grau em todas as pessoas, pode se revelar…

3 dias ago