Ana Macarini

E por que não no elevador?

Imagem de capa: Denis Valakhanovich, Shutterstock

Ela havia acabado de sair de um namoro que já vinha assim meio que se arrastando há alguns meses. Aqueles fins de relacionamento em que nenhum dos dois mais sabe o que é que está fazendo junto, mas tem um pouco de medo – ou será preguiça? -, de encerrar a história e descobrir lá fora na vida o que é que que há de novo.

Naturalmente veio aquela ressaca pós-término. Um pouco era saudade dos bons momentos que ficaram na memória; um pouco era pena porque “é sempre triste no fim”; um pouco era apego ao hábito da vida já conhecida e livre de riscos inesperados.

Mas… se até ressaca de tequila passa… Por que é que ressaca de namoro que não vingou não haveria de passar?! Tanto passa, que passou. E, junto com o fim da ressaca veio a sede e a curiosidade de provar outros sabores. Veio também uma espécie de renascimento; um desejo de resgatar de lá do passado, amigos, festas e noites que ficaram esquecidos no tempo, no espaço de uma vida sem compromisso.

Foi assim que naquela noite ela se arrumou, perfumou e se fez bonita para si mesma. Saiu dirigindo tranquila, com o corpo perfeitamente encaixado em sua nova realidade, e o pensamento solto, dançando ao som de uma música divertida que tocava no rádio do carro.

Era uma festa de aniversário. De uma amiga querida que não via há muitos anos. Uma amiga que sempre fazia festas memoráveis para comemorar a passagem dos anos. Festas às quais “nossa heroína” nunca comparecia porque o tal ex-namorado não gostava de festas. E ela foi cultivando ao longo do relacionamento uma dependência daquelas que fazem um casal não saber ser outra coisa, além de ser um casal.

Enquanto estacionava o carro, “nossa bela recém-solteira” não conseguiu evitar de pensar em como seria estar em uma festa tendo outra vez o coração e a vida livres. Por um instante, quase pensou em ir embora. Mas não foi.

O elevador chegou ao térreo e ela embarcou. Como sempre, distraída, esqueceu-se de marcar o andar. Só se deu conta da distração quando o “veículo” chegou ao subsolo e por sua porta entrou um homem. Um homem daqueles que têm um sorriso de arrasar quarteirões.

Não bastasse o sorriso, o cara era uma mistura de caiçara (uma pele super bronzeada), vocalista de banda de rock (o cabelo comprido e uma barbinha charmosa por fazer), e lobo de Wall Street (estava de terno e gravata – impecáveis por sinal!). Não bastasse todo esse conjunto da ópera, o “príncipe” ainda trazia em uma das mãos um belíssimo arranjo de orquídeas e, na outra, uma garrafa de vinho.

Um pouco em choque pela aparição, “nossa surpresa garota”, balbuciou um “Boa noite” em resposta ao cumprimento do gato e ficou observando a porta do elevador se fechar. Então, percebeu que um dos dois precisaria dizer ao elevador onde ele tinha que ir, e perguntou “Qual é o seu andar?”, e o gato respondeu “Vinte e três, por favor?”.

Foi nesse momento que a noite começou a ficar realmente melhor. Eles iam para o mesmo lugar. Quanto tempo será que um elevador gasta para ir do terceiro subsolo ao vigésimo terceiro andar?! A ela pareceu uma viagem longa… posto que o “deus grego” não tirava os olhos dela. De repente, ele pergunta: “Você não é a Bel?”.

E, sim, ela era a Bel. Bem… pelo menos ela era uma Bel. Mais por espanto do que por curiosidade, a pergunta voa de seus lábios: “Como é que você sabe o meu nome?”.

O fato é que não deu tempo de o gato responder. Nesse instante o elevador se abriu, ele segurou a porta para que ela passasse e tocou a campainha. O apartamento foi aberto por uma sorridente aniversariante que, ao se deparar com os dois juntos à sua porta, dispara: “Nossa Felipe! Não acredito que você encontrou a sua musa!!!”.

E foi a partir daí que uma história de amor teve início. A história entre duas pessoas improváveis que se descobriram num elevador. Ela descobriu que ele a cobiçava há muito tempo, graças a uma foto tirada na adolescência e que morava pendurada no quarto da amiga, em tributo à uma antiga amizade.

Ela descobriu que por trás daquele homem, cuja figura externa impactava, havia ainda um ser humano muito mais belo e interessante. Uma pessoa íntegra, inteligente, curiosa, bem-humorada e gentil. E se a viagem de ida no elevador pareceu interminável…. A viagem de volta, pareceu acontecer na velocidade de um raio; porque afinal de contas, os primeiros beijos costumam fazer as pessoas perderem a noção do tempo, não é mesmo?

Se durou para sempre?! Ahhhhh… eles ainda estão descobrindo.

Ana Macarini

"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"

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