Imagem de capa: WAYHOME studio/shutterstock
Sem perceber, você foi se afastando aos poucos dos amigos, de todos os amigos. Sem perceber, os hábitos diários foram ficando cada vez mais rígidos e configurados a serviço de uma rotina invariável, cuja função é mantê-lo aparentemente dentro de uma situação segura e protegida. Sem perceber, os sorrisos foram ficando mais raros, as ruguinhas no centro dos olhos foram ficando mais fundas, a tensão nos ombros passou a ser uma companhia constante. Sem perceber, você foi se adaptando a dias solitários que viraram semanas, que viraram meses. Sem perceber, o que você vem aceitando como sendo características pessoais de “personalidade forte” ou “gênio difícil” podem ser sinais de uma disfunção afetiva.
A Distimia é facilmente confundida com mau-humor, uma vez que portadores desse transtorno de conduta apresentam comportamentos pouco sociáveis, irritam-se com extrema facilidade e perdem a razão por causa de seu “pavio curto”. Essas pessoas acabam se afastando do convívio com colegas, amigos e familiares, na tentativa de parar de sofrer, por não sentir prazer na convivência com o outro.
Os distímicos não chegam a ter crises avassaladoras como as têm aqueles que sofrem de Depressão Clássica. No entanto, a amargura torna-se uma companheira fiel, que acorda e vai para a cama com a pessoa todo santo dia. O que difere a Distimia do “mau-humor” é que o portador não é apenas pouco dado a sorrisos e gentilezas e toca sua vida numa boa. Os ditímicos sofrem por não conseguirem estabelecer e manter relacionamentos de amizade, profissionais ou amorosos; eles não sentem nenhum prazer em destratar as pessoas; passam a ter sentimentos de menos valia, pouca ou nenhuma confiança em si mesmos e buscam o isolamento, pois estar entre outras pessoas, coloca-os numa situação de enorme desgaste emocional, já que têm dificuldades para controlar e evitar comentários ácidos, impaciência e agressividade.
O fato é que ninguém se sente confortável carregando para lá e para cá uma cabeça que murmura reclamações o dia todo, não consegue achar graça nem nas grandes, nem nas pequenas coisas, vive criticando tudo ao seu redor e não relaxa nunca, porque sente-se inadequado em relação ao mundo e sente que o mundo é inadequado para si. De acordo com a ABRATA (Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos), existem mais de 11 milhões de brasileiros sofrendo desse mal.
Não há estudos conclusivos acerca das causas da Distimia; médicos e psicólogos apontam para a possibilidade de fatores bioquímicos (alterações cerebrais), genéticos (parentes de primeiro grau diagnosticados), ambientais (rotinas desgastantes ou exposição a situações críticas de estress), ou comportamentais (depender excessivamente da aceitação e atenção do outro). É, também, comum, aparecer sintomas distímicos em pacientes portadores de outros transtornos mentais, como síndrome do pânico ou fobias graves.
Quanto antes for feito o diagnóstico preciso, quanto mais chances o paciente terá de aprender a reconhecer, conviver e administrar os sintomas da doença. É absolutamente normal sentir-se triste diante de uma perda, ficar aborrecido quando algo sai errado, perder a paciência com gente sem noção ou querer ficar sozinho às vezes, para aproveitar a própria companhia. No entanto, se a tristeza, a exasperação, a irritabilidade e a necessidade de isolamento tornarem-se uma constante, a ponto de interferir negativamente em sua vida pessoal, laboral e afetiva, é bom investigar. Dividir a aflição com alguém próximo, um amigo ou familiar, a princípio já é um primeiro passo. Mas, é indispensável buscar ajuda de psicólogos e psiquiatras; só um profissional capacitado poderá analisar e confirmar a ocorrência de uma patologia ou determinar se aquele quadro comportamental refere-se apenas a uma fase ou traço de personalidade.
Uma vez feito o diagnóstico correto e assertivo, é necessário aderir ao tratamento psicoterápico e medicamentoso (se for o caso). E, como em qualquer outro tipo de transtorno afetivo, faz-se absolutamente necessário o envolvimento e apoio das pessoas mais próximas. Nenhum de nós nasceu com escudo de proteção que nos impeça de sermos atingidos pela dolorosa experiência de ter de conviver com um transtorno de humor. Por isso, sejamos capazes de entender que a dor do outro não pode ser sentida por nós, mas que ele a sentirá menos pesada e cruel se tiver a nossa mão para segurar. Afinal, generosidade, amorosidade e empatia são remédios altamente potentes contra a dor de qualquer natureza.
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