André J. Gomes

A sorte tem o riso solto. Sorria que ela sorri de volta.

Imagem de capa: pathdoc/shutterstock

É verdade. Ninguém tem a obrigação de fazer nada só para agradar o outro. A gente faz porque quer. Faz se quiser. Pelo menos devia ser assim. Se você agradar, muito bem. Se incomodar, paciência. Acontece. Há de ser sempre assim. Uns gostam de você, outros não. Fazer o quê?

Agora, a desobrigação de agradar quem quer que seja não dá a ninguém o direito de sair por aí agredindo de graça. Isso é feio, mesquinho, rasteiro. Próprio de quem confunde liberdade com libertinagem. Pura e simples falta do que fazer.

Falar com liberdade o que vai no pensamento é uma grande qualidade. Pessoas autênticas fazem isso muito bem. O problema é que muita gente se orgulha de possuir esse atributo quando na verdade só o tem pela metade: o sujeito possui uma disposição imensa para falar mas mantém uma preguiça enorme de pensar. Fala justamente o que não raciocina. Tagarela sem refletir. Discursa demais e pondera de menos. Repete insultos prontos. Fala sem pensar. E isso, cá entre nós, não é autenticidade. É burrice, ato proposital de estupidez, cretinice assumida.

Que as mulas não nos ouçam com suas orelhas enormes, pontudas, compridas, mas elas são ótimas em zurrar a todo canto que não são obrigadas a dizer “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite”, que não devem doçura a ninguém, que preferem ser vistas como mal educadas do que como “hipócritas”, que isso e aquilo. Tudo sempre em um tom muito afetado, acusatório e generalizador, como se todas as pessoas gentis do mundo fossem falsas, enganadoras, dissimuladas e canalhas.

Aqui comigo eu tenho a impressão de que toda pessoa inteligente deve, sim, fazer um esforço para mudar os péssimos hábitos grosseiros que se instalaram entre nós. Lembrar-se todo dia de exercitar a sensibilidade e a gentileza, cumprimentar os outros, pedir licença, agradecer. Assim, como lição diária, até tudo isso se tornar espontâneo, habitual, e nos darmos conta do quanto se pode melhorar a nossa convivência geral a partir dos pequenos gestos de cada um. Mas tudo bem. Eu entendo que ninguém é obrigado a nada, inclusive a trabalhar um pouquinho mais para deixar o mundo menos pior.

No entanto, o fato de não sermos obrigados a fazer gentilezas não quer dizer que somos livres para fazer grosserias. Já que não temos o compromisso de agradar, também não temos o direito de agredir ninguém. Começando pela agressão de falar sem pensar. Falemos, então, o que pensamos. Mas, por favor, pensemos de fato. Se não vamos agradar, também não precisamos agredir.

André J. Gomes

Jornalista de formação, publicitário de ofício, professor por desafio e escritor por amor à causa.

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André J. Gomes
Tags: sorte

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