Imagem de capa: juninatt, Shutterstock

Meu silêncio. Sempre me mantive longe dele, sempre que este espreitava a esquina da minha mente, eu o empurrava com qualquer barulho que fosse. Podia ser com um monólogo televisivo com de sons recheados de ação, ou o ruído ensurdecedor de festas ou conversas rasas sobre os mesmos sons. Pode parecer ruim, mas me deliciava com estes momentos, pois parecia que meu silêncio era amordaçado. Doce ilusão. Às vezes ele fingia que não existia, se fazia de cachorro manso, mas assim que eu baixava a guarda ele gritava comigo, me surrava o corpo, e assim, o ânimo. Outras vezes, ele parecia se acalmar e se acomodava nos fundos de algum bar de memórias, revirando cada copo e sempre vendo uma felicidade borrada.

Meu silêncio podia amanhecer inofensivo e, com o passar do dia, se alimentando de pensamentos suculentos em angústias, se tornar um monstro de um metro e noventa, pronto para me dilacerar com palavras e uma cinta de couro. Eu sempre estava correndo, buscando algo que me pediram para que buscasse ou me isolando em algum lugar para que ele não me alcançasse… Eu não queria parar, não porque eu me preocupava com o que pensariam de mim, mas sim porque eu nunca havia enfrentado o monstro que perseguiu por anos, sempre pronto para fazer sangrar minha alma com o menor movimento possível.

Meu silêncio invadiu meus sonhos, revirou minha cama, rasgou meu sono em pedaços e se fez guardião da minha felicidade, dosando em um conta-gotas como e onde eu poderia sorrir. Com o tempo, adoeci. Meu peito quebrou, minhas pernas definharam, minha mente se rendeu, minha humanidade foi reduzida à uma massa repleta de angústia e irá, mascarando os choros e surtos com um sorriso anêmico que sussurrava pedidos de socorro aos desavisados à minha volta.

Fui dominado, reprimido, acorrentado, apequenado. Era o fim. O silêncio se tornou tão grande que parecia que não havia mais espaço para a vida e, são nestes momentos, que a morte parece até uma sobremesa tão desejada depois de um almoço repleto de sofrimento. Os dias se tornaram mais longos e meu silêncio mais pesado. Assim me afoguei em copos de bar e festas, me ensopei em gritaria. Caí. Imóvel. Estatelado. Um cadáver sem emoção. Mas me estenderam a mão, era uma daquelas pessoas que se jogam ao mar para salvar o náufrago mesmo sabendo que existe somente um lugar em sua barca, arriscando afundar para ajudar alguém que escolheu parar de nadar.

E foi assim, depois de um tempo e com a ajuda dessa navegadora da vida. Me fiz forte e grande. Parei de correr de algo que nunca havia enfrentado. Virei para trás e desmascarei o monstro que havia criado, fazendo-o humano novamente. Consegui rever o que havia jogado fora. Percebi minha grande mentira. Meu silêncio não era enorme, eu o fiz assim. Meu silêncio não só me batia com sua cinta, mas também me abraçava. Meu silêncio não só me criticava, mas também sabia me colocar em seus ombros para ver mais alto. Meu silêncio não bebia por ser um monstro, mas porque era alguém como eu e sofria seu próprio silêncio. Meu silêncio também chorava, também sangrava, também sorria, também amava.

Enfim, desfiz a prisão que havia criado dentro de mim. Enfim, abracei meu silêncio e pude finalmente agradecer por tudo, e por ter me tornado quem me tornei graças a ele. Enfim, eu pude dizer, sem ruídos, sem angústia ou ira, com palavras claras e verdadeiras:

– Pai, obrigado por tudo, eu te amo.

Mike Akama Mazurek

Mike A. Mazurek, formado em Comunicação e Mestrando em Comunicação e Práticas de Consumo, futuro professor e escritor pelo prazer da vida.

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Mike Akama Mazurek

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