Imagem de capa: Mikhail Siamenau, Shutterstock

Ele partiu e deixou um rastro de dor. Foi lancinante, a ferida sangrou e não tive forças para conter a hemorragia. As lágrimas jorraram do meu peito e o ar faltou aos pulmões. O coração confidenciou as mais profundas angústias e o futuro me foi confiscado. Com o giro dos ponteiros fui me apaixonando pela condição de presa e me sentindo confortável na agonia da vitimização. Vi beleza nas olheiras e graça na alcunha de sofredora. Culpei terceiros por todo meu martírio e me esqueci de olhar para dentro.

Os sorrisos desapareceram como fumaça, os anseios foram cancelados, os sonhos anulados e a esperança sepultada. Na dor da ausência de vida a solidão me vestiu como luva e o vazio se preencheu de mais vazio. O desgosto do acordar minava a confiança do despertar. Em sono profundo eu me encontrava imune à vitalidade de uma mulher que sempre sorriu com os olhos. Me enclausurei em desconsolo e roguei as mais infames pragas aos que, livres, sorriam pro sol. O confinamento interior deteriorou o casco e a carne foi perdendo brilho e cor. Reclusa, me enganei e quase, eu disse quase, desisti do amor.

Olhando para aquele tempo vejo que toda dor e amargura originaram da expectativa que criei para uma vida que não era minha, não pertencia ao meu universo particular. Idealizei o que não me era cabível. Fantasiei um sorriso que outros lábios deram e calaram a voz que gritava silenciosa dentro de mim. A expectativa maldita cegou os olhos do entendimento e eu me perdi entre a fantasia e a realidade.

Fui construindo um castelo onde os outros eram responsáveis por me fazer feliz. A incumbência da rota era designada aos que me cercavam e o destino eu não me interessava em saber. Arremessei todos os objetivos e planos na mala dos viajantes, que de passagem, levavam um pouco de mim. Eu não agregava, não doava, não mergulhava. Só suguei, extraí e arruinei.

Foi um desperdício de vida, do amor que não dei, das forças que esbanjei na direção errada, da energia que não canalizei. No cuidado egoísta de não arriscar quase coloquei tudo a perder. Soltei as rédeas e deixei que o cavalo da vida cavalgasse sem rumo e, por fim, chegasse a lugar nenhum.

Na poesia do sofrer, perdi o querer.
Na prosa de viver, vou me atrever.

Monika Jordão

Atriz, escritora e paulistana. Acredita que o papel reflete mais do que o espelho. Apaixonada por livros, futebol, tequila, café e Coca-Cola. Buscando sempre o equilíbrio emocional e os amores inesquecíveis.

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Monika Jordão

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